A folha de pagamento de janeiro de 2016 dos servidores do Estado do Ceará corre o risco de vir com uma redução de cerca de 10% (dez porcento) em seu valor real. Isso se dá em razão da decisão do Governo do Estado de impedir a recomposição salarial diante das perdas inflacionárias que esse ano margearam o percentual acima mencionado.

Nesse contexto, questiona-se: há fundamento legal para tal decisão política?

De acordo com o artigo 37, X da Constituição Federal de 1988, cabe a lei específica fixar e alterar a remuneração dos servidores, desde que assegurada a revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índice.

Interpretações políticas ou administrativas da referida norma devem manter o mínimo de sintonia com a determinação constitucional, caso contrário estar-se-á moldando a segurança da disposição textual à instabilidade das decisões políticas e governamentais.

Compreende-se assim, que impedir a revisão anual dos salários dos servidores, ou seja, sua mera correção monetária configura violação da expressa e literal disposição normativa contida na Lei Maior, segundo já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 565.089 impetrado por servidores do Estado de São Paulo.

Nessa ocasião foi esclarecida inclusive a distinção entre aumento e o reajuste pretendido, sendo este apenas a garantia de preservação do valor aquisitivo da remuneração, não configurando qualquer adição ao valor real da contraprestação devida aos servidores estaduais, mas readequação legalmente concedida em face da corrosão inflacionária, o que caracteriza simples correção monetária, a qual é devida nas lides judiciais ainda que não haja pedido expresso nesse sentido.

Ademais, conforme prevê o artigo 37, XV do texto constitucional, os vencimentos dos servidores públicos são irredutíveis, salvo se ultrapassarem o teto previsto no inciso XI desse mesmo artigo, ou no caso de acúmulo indevido de acréscimos pecuniários, ou ainda na hipóteses de discriminações tributárias, o que não ocorreu.

Observa-se, assim, a total incompatibilidade entre a determinação constitucional e a decisão política de congelamento salarial tomada pela atual gestão, o que configura ruptura da segurança jurídica tendo em vista que a autonomia orçamentária estadual está delimitada pelo próprio ordenamento, não havendo autorização legal para se descumprir  essa expressa disposição constitucional.

Quais as consequências da manutenção dessa decisão?

Poderá surgir uma série de questionamentos judiciais frente ao desrespeito à revisão anual constitucional e à irredutibilidade salarial real, os quais podem ter caráter de urgência porque o salário tem natureza alimentícia.

Stenisia Denis Holanda Lavor – Advogada OAB-CE 28.167