Leandro VasquesPor decisão do juiz Sergio Moro, há cerca de dois meses, o ex-presidente Lula foi conduzido coercitivamente pela Polícia Federal, no âmbito da Operação Lava Jato. Mas esse fato ainda tem apresentado desdobramentos, como a ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 395) ajuizada, aos 11 de abril último, pelo PT junto ao STF.

Na aludida ação, questiona-se a possibilidade de o juiz determinar a condução de quem não atender à intimação para a realização de interrogatório (leia-se levar à força), nos termos do artigo 260 do Código de Processo Penal, bem como a inconstitucionalidade do uso da condução para coleta de depoimentos.

De acordo com a arguição petista, a condução coercitiva não estaria de acordo com a Constituição Federal, pois todo e qualquer investigado tem o direito de não se autoincriminar e o de permanecer em silêncio quando interrogado.

No caso de Lula, Moro considerou que a medida evitaria tumultos e confrontos entre manifestantes. A condução do ex-presidente não cercearia seus direitos nem o colocaria em situação vexatória, servindo apenas para prevenir incidentes. Foi feita ainda a ressalva de que a condução coercitiva só se daria com a recusa de Lula ao “convite” para restar depoimento.

Não pretendo nessas rasas linhas discutir o mérito das acusações e das suspeitas que pairam sobre Lula e os demais investigados, mas o questionamento é bastante pertinente. Se o indivíduo tem o direito de ficar calado quando interrogado, por que deveria ser levado à força apenas para ser ouvido?

Vale mencionar também que a condução coercitiva prevista na lei aplica-se em ações penais, ou seja, quando já há denúncia oferecida pelo Ministério Público e recebida pelo Poder Judiciário. Como havia apenas uma investigação policial em curso, Lula não figurava como réu.

Mesmo quando praticada contra nossos desafetos políticos, as ilegalidades ofendem todo o sistema de justiça criminal, o que acaba por atingir a todos e a cada um de nós. Quando alguém é conduzido apenas para ser ouvido, ainda que por algumas horas, é na verdade “preso” por algumas horas e apenas para ser ouvido, não importa o verniz jurídico que se dê ao fato.

Essa ação manejada pelo PT aos 11 de abril, acaso encontre agasalho no STF, trará repercussões devastadoras não só na afamada Operação Lava Jato, mas a toda aquela em que pessoas foram conduzidas coercitivamente e tenham prestado “indevidas” declarações. Aguardemos os próximos capítulos.

Leandro Duarte Vasques

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Advogado criminal, mestre em Direito pela UFPE, professor da Pós-Graduação em Processo Penal da Unifor, Diretor Consultivo da Escola Nacional de Advocacia – ENA