notapublica (1)A Ordem dos Advogados do Brasil Secção Ceará (OAB-CE), por meio da Comissão de Direito Penitenciário, torna pública sua posição perante o atual colapso do sistema prisional brasileiro.

 

Uma “tragédia anunciada”. Assim pode-se considerar a guerra entre facções no Estado do Amazonas, que culminou na morte de 60 presos, na fuga de outros 112 detentos e chocou o país pela violência utilizada, pois inúmeros detentos foram decapitados e esquartejados. No estado de Roraima, ocorreu um novo massacre com mais 30 mortos.

Tem-se, em ambos os presídios, do Amazonas e de Roraima, uma superlotação carcerária. O primeiro possui capacidade para abrigar 450 detentos e tem hoje uma população carcerária de mais de 1200 detentos. O segundo possui 700 vagas e recebe, hoje, mais de 1400 presos. A situação é semelhante aos presídios de outros estados brasileiros, como o caso do Ceará, que, por exemplo, inaugurou, já superlotado, em novembro de 2016, o Centro de Execução Penal e Integração Social Vasco Damasceno Wayne (CEPIS). Com cerca de 1000 vagas, o presídio já abriga mais de 1500 presos. No Ceará não se pode olvidar a morte de inúmeros detentos que ocorreu no ano de 2016 e que vem se repetindo. O clima de tensão é constante.

No Brasil, a Coordenação de Acompanhamento do Sistema Carcerário do Conselho Federal da OAB inspecionou, nos anos de 2014 e 2015,  várias unidades no Brasil e alertou as autoridades sobre a crise carcerária em nível nacional.

A Comissão de Direito Penitenciário da OAB-CE também vem chamando atenção para o colapso do sistema penitenciário cearense há muitos anos, por meio de notas públicas, ações judiciais e de relatórios enviados à Secretaria de Justiça do Estado, União Federal, Conselho Nacional de Justiça, além de diversos outros órgãos. A Comissão vem realizando inspeções nos estabelecimentos carcerários do Estado, denunciando o desrespeito à Constituição Federal, à Lei de Execução Penal e a diversos tratados e convenções internacionais que abordam o tema e que estão sendo horrendamente desrespeitados. Entre os problemas advertidos pela OAB-CE, podem-se citar a pouca oferta de trabalho e estudo nos estabelecimentos carcerários, a presença maciça de membros de facções organizadas, a existência de presos provisórios dividindo o mesmo espaço com presos condenados, superlotação, dentre outros.

Em uma tentativa de melhorar esse quadro, a OAB Ceará realizou, no dia 11 de julho de 2016, uma audiência pública a fim de debater a caótica situação dos estabelecimentos penitenciários, que resultou em um documento com 34 recomendações, no qual se pediu que fosse decretado Estado de Emergência na segurança pública e no sistema carcerário, evitando que um novo derramamento de sangue ocorresse dentro dos estabelecimentos penais do Ceará, inclusive com a recomendação que fosse solicitada a Força de Segurança Nacional no Estado, tanto nas ruas como nos presídios, para reforçar a segurança. Também foi sugerido, em caráter emergencial, a contratação de pelo menos 2000 agentes penitenciários por meio  de concurso público para diminuir a tensão nos presídios. Outra proposta foi a instalação imediata de bloqueadores de celulares nas unidades. No entanto, notamos que o Estado não empreendeu o esforço suficiente para conter o problema.

É inaceitável que o sistema cearense continue com uma superlotação que atinge mais de 70% da sua capacidade. Para se ter ideia, estima-se que existam cerca de 21000 pessoas encarceradas no Estado, quando a capacidade real seria para no máximo 13000 detentos. O mais bárbaro é a presença de detentos em delegacias de polícia, o que prejudica ainda mais a segurança pública do nosso Estado e desrespeita a Lei de Execução Penal. Não se pode olvidar que sequer existe unidade específica voltada para o regime semiaberto no Estado do Ceará.

Vale ressaltar ainda que em virtude da falta de estrutura nos presídios e delegacias, o trabalho do advogado criminalista fica também prejudicado, sendo certo que constantemente a OAB recebe denúncias de desrespeito às prerrogativas dos causídicos.

Necessária se faz também a implementação da audiência de custódia tanto na capital como no interior, além do cumprimento da Lei Processual Penal que determina que a prisão deva ser voltada apenas para os casos mais graves, sempre se preferindo uma medida cautelar mais branda.

A OAB compreende que o sistema penitenciário brasileiro precisa de reformas urgentes e, desde já, se coloca à disposição para auxiliar o Estado no que for necessário, ciente de que, para uma real mudança, é necessário não só o respeito à dignidade humana dos encarcerados mas também investimentos em políticas públicas com o fito de melhorar a saúde, a educação e a segurança da população. É necessário também que a União seja parte ativa desse processo.

Comissão de Direito Penitenciário – CDP