Entre os dias 6 e 8 de junho, Fortaleza foi palco do VIII Congresso Nacional de Direito LGBTI. Na ocasião, foram debatidos diversos temas relacionados a atual situação da população LGBTI no país que resultaram na Carta Aberta do VIII Congresso Nacional de Direito LGBTI.

Para a membra da Comissão Nacional de Diversidade Sexual e Gênero da OAB Federal e organizadora do evento, Lilian Viana, foram três dias de muito aprendizado, com várias trocas de experiências e com palestras em alto nível. “A sociedade cearense merecia a oportunidade de ter acesso a informação a temas complexos e por vezes inacessíveis. A criação deste espaço com a execução de um congresso nacional para debatermos a temática LGBTI em suas mais diversas esferas me deixa feliz e com a sensação de dever cumprido pela alta aceitação dos congressistas e dos ótimos comentários sobre todas as mesas”, disse.

Confira a Carta Aberta do VIII Congresso Nacional de Direito LGBTI:

Nós, participantes do VIII Congresso Nacional de Direito LGBTI da Ordem dos Advogados do Brasil, reunidos na cidade de Fortaleza – Ceará, entre os dias 06 a 08 de junho de 2018, debatemos sobre a atual situação da população LGBTI no país, em suas mais diversas áreas. Reconhecemos o retrocesso de direitos, a não acessibilidade desta população nos mais diversos serviços da sociedade, além da luta pelo simples fato de existência, já que o Brasil ainda é o país que mais mata LGBTs no mundo, aprovamos as seguintes propostas:

  1. Incentivar campanhas de conscientização em respeito à população LGBTI;
  2. Criar mecanismos de recebimento de denúncias para averiguar de forma efetiva crimes contra à população LGBTI;
  3. Defender a visibilidade da população LGBTI, repudiando qualquer ato que venha associar esta população à marginalização social;
  4. Exigir do Governo do Estado do Ceará a implementação já prometida no campo do boletim de ocorrência, que faça constar “Orientação Sexual” e “Motivação do Crime”, a fim de termos estatísticas oficiais da quantidade de crimes contra LGBTs no estado;
  5. Exigir do estado que a população LGBTI tenha acesso a uma cidadania plena, podendo viver em um mundo livre, com segurança, com sua dignidade e acesso aos bens comuns, em condições de desenvolver a si mesmos e suas capacidades sem interferência do ódio ou da violência de gênero;
  6. Condenar atos lgbtfóbicos em todos os espaços e quando ocorrerem, que sejam apurados, tomadas as devidas providências e explicados à sociedade, como o supostamente ocorrido no Centro Cultural Belchior, que foi esclarecido e feito composição posteriormente;
  7. Criação de um Centro de Referência Estadual para atendimento à população LGBTI;
  8. Defender o Estado Democrático, que passa a inexistir quando uma parcela imensa da população está submetida ao medo, a condições desumanas de existência, ao estigma e à discriminação;
  9. Defender o direito genuíno da livre manifestação dos movimentos sociais frente aos retrocessos ocorridos nos últimos dois anos;
  10. Lutar pela efetivação de direitos dos parceiros oriundas da relação conjugal homoafetiva;
  11. Incentivar empresas a adotar critérios de contratação não discriminatória;
  12. Promover campanhas publicitárias de conscientização para empresas direcionados para determinados grupos vulneráveis como: afrodescendentes, índios, portadores de HIV, portadores de deficiência, idosos etc.
  13. Reafirmar a importância do cumprimento da convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o artigo 3º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
  14. Disseminar o respeito à LGBTs dentro dos movimentos sindicais das categorias de trabalhadores e de empregadores, junto com as comissões locais de trabalho;
  15. Defender e adotar ações práticas de investigação e punição no âmbito de trabalho diante de atos lgbtfóbicos;
  16. Cobrar celeridade e o retorno do julgamento por parte do Recurso Extraordinário nº 845779 (uso do banheiro por transexuais), com repercussão geral reconhecida, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e que esta suspenso há quase dois anos depois de pedido de vista do ministro Luiz Fux;
  17. Promover a publicização de empresas que atentem contra os direitos da população LGBTI;
  18. Defender o direito ao acesso à saúde de forma digna da população LGBTI;
  19. Promover meios eficazes através do Sistema Único de Saúde ao acesso rápido às cirurgias de transgenitalização para aqueles que não possuem recursos econômicos, uma vez que há um verdadeiro adoecimento da população Trans em função da demora, por vezes, levando a morte, já que estes acabam por usar hormônios sem acompanhamento médico, gerando complicações em aplicações corporais de silicone industrial, automutilações das genitálias etc;
  20. Defender a modificação na lei por parte do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que possa haver concessão de salário maternidade para as duas mães, a fim de que o direito se adeque as novas normas de família;
  21. Exigir que os tribunais apliquem imediatamente a possibilidade de licença maternidade para as duas mães, no caso das duas serem seguradas, por analogia aos casos quando há uma gestação por substituição, onde tanto a parturiente quanto a mãe adotiva ou biológica podem tirar a licença, não havendo prejuízo quando o mesmo caso ocorrer em situações com casais homoafetivos;
  22. Cobrar ao Governo do Estado do Ceará a imediata inauguração do ambulatório transexualizador;
  23. Fortalecer políticas internas para garantir o combate a Transfobia dentro dos quadros da ordem;
  24. Ratificar sempre que possível e necessário, o combate ao preconceito contra a transexualidade e a disforia de gênero, que já não fazem parte das doenças mentais incluídas no manual de diagnóstico do DSM desde o ano de 2012;
  25. Fiscalizar o novo manual da Organização Mundial da Saúde (OMS), previsto para ser lançado no final de 2018, sobre a previsão da retirada da transexualidade e a da disforia de gênero como transtorno mental, passando a serem chamadas de “incongruências de gênero”;
  26. Incentivar a proteção e promoção dos direitos da Diversidade Sexual e da Democracia como espaço essencial para a realização desses direitos no Brasil;
  27. Incentivar a luta pelos direitos da comunidade LGBT no Brasil, que não diz respeito somente à comunidade LGBT, ela é, sobretudo, uma luta pelo alargamento da noção de humanidade;
  28. Exigir do Governo do Estado do Ceará, mecanismos de implementação de coleta de dados oficiais da violência contra a população LGBTs em hospitais e postos de saúde, a fim de distinguir a violência sofrida desta população pela sociedade do ambiente familiar, escolar ou laboral e com isso, direcionar mais positivamente as mais diversas campanhas de conscientização;
  29. Defender a adoção de medidas de atendimento à população LGBTs em delegacias especializadas;
  30. Denunciar o crescimento do discurso lgbtfóbico em todas as camadas da sociedade;
  31. Repudiar a aprovação de projetos de leis que tramitam nas mais diversas casas legislativas deste país que visam destituir direitos da população LGBTs;
  32. Exigir políticas públicas de promoção dos direitos da população LGBT;
  33. Defender a constituição de 1988, emendando-a no que for necessário, mas na perspectiva de ampliar direitos e não de suprimi-los;
  34. Exigir que os cartórios do estado, cumpram imediatamente a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que autorizou a mudança de nome e gênero no registro civil, sem necessidade de cirurgia, avaliação médica ou psicológica, ou seja, não há por que esperar por regulamentação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para este ato;
  35. Propor através da Comissão Nacional da Diversidade Sexual e Gênero da OAB Federal ao Conselho Federal da OAB, que solicite uma audiência pública conjuntamente com o Conselho Federal de Medicina, para averiguar junto ao legislativo projetos de leis que versem sobre a reprodução assistida e depois, requerer providências a este legislativo que criem leis sobre o tema, já que até hoje não há legislação;
  36. Defender a criação de mecanismos de desconstrução de preconceitos dentro da área médica, que por vezes, eivados da prerrogativa de abjeção de consciência, com um julgamento deontológico administrativo e pela falta de legislação, deixam de atender e de efetuar procedimentos quando o paciente é LGBT;
  37. Defender a aprovação do Projeto de Lei, sugestão 61 de 2017, que versa sobre o Estatuto da Diversidade Sexual e de Gênero e que tramita no Senado Federal;
  38. Defender a criação e a entrega de uma medalha como membro vitalício “honoris causa” a atual presidenta Maria Berenice Dias, que deixará a presidência da comissão nacional ao final da gestão, como forma de agradecimento ao seu brilhante trabalho à frente das mais de 200 (duzentas) comissões espalhadas pelo Brasil em todas as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil.

 

Fortaleza, 08 de junho de 2018