Nota de Manifestação da Comissão de Estudos Políticos e da Comissão de Políticas Públicas sobre Drogas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Seccional Ceará sobre o Decreto n° 9.759, de 11 de abril de 2019, que extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal.

1 – É de cristalina constatação o fato de que a democracia direta, embora nobre, é manifestamente inviável em um estado populacional e territorialmente gigante como o brasileiro. Isto, contudo, não equivale a dizer que no modelo de democracia representativa o exercício do poder pelo povo se esgote exclusivamente através do parlamento ou em eleições para cargos públicos.

2 – Ferramentas de inclusão e participação popular na tomada de decisões da administração pública, influenciando na formulação de diretrizes e execução de políticas públicas, são essenciais para a boa qualidade do regime democrático. Neste sentido, os conselhos federais assumem importância essencial.

3 – Sendo elemento precípuo na consolidação dos valores democráticos e da justiça social, a abertura e efetivo funcionamento de canais para participação popular é meio hábil para assegurar maior visibilidade aos interesses sociais, oportunizando ações e políticas públicas que promovam de fato a inclusão cidadã, especialmente dos grupos sociais mais vulneráveis. Sendo importante mecanismo de inclusão social, prevenção da corrupção e fortalecimento da cidadania, os Conselhos garantem o controle social da Administração Pública, fiscalizando e monitorando todo o processo de criação e implementação de políticas públicas.

4 – Excede em muito as competências destas Comissões interferir na organização interna da administração pública federal. Esta é uma prerrogativa constitucional do presidente da República. Se a intenção do decreto era a de reestruturar a atuação dos conselhos federais, garantindo o mesmo nível de participação popular, este deve ser respeitado.

5 – Apesar disso, há fundado receio de que o decreto resulte na sub-representação de variados setores da sociedade civil, reduzindo a participação popular no processo de tomada de decisões, especialmente em temas que dizem respeito individualmente a cada classe.

6 – Isto porque, ao largo de quaisquer matizes ideológicas ou partidárias, é perceptível a falta de clareza no texto decretado, que não faz menção específica a quais órgãos deveriam ser extintos ou não, havendo previsões na imprensa que variam entre 35 a 700 conselhos federais.

7 – A medida tem motivado forte reação de variados setores da sociedade, haja vista que, na dúvida se o decreto extingue o seu conselho ou não, as organizações tem optado por agir na defensiva e presumir que estão entre os órgãos abrangidos. Por mais que a intenção de desonerar e desburocratizar a máquina pública possa ser legítima, o governo federal prejudica a si mesmo ao adotar medidas confusas como esta, estimulando a insegurança jurídica e instabilidade social.

8 – Em que pese a declaração do Ministro da Casa Civil de que foi oportunizado a todos os conselhos o prazo de 60 (sessenta) dias para que justifiquem sua existência, isto não consta no teor do decreto. Também não há informações sobre a quem esta justificativa seria dirigida, e sobre quais critérios serão adotados para decidir sobre a manutenção ou não de cada órgão.

9 – Alertamos, ainda, para o fato de que os três maiores indicadores internacionais de qualidade da democracia conferem alta relevância para o nível de participação popular na tomada de decisões. Se este decreto for mantido em seu inteiro teor e atingido o objetivo declarado pelo Ministro da Casa Civil – isto é, reduzir a quantidade total para 50 conselhos –, é de se esperar ao final do ano uma queda abissal na avaliação da democracia brasileira.

10 – Neste contexto, firme no seu entendimento da importância da participação popular para o controle social da Administração Pública e a implementação de políticas públicas inclusivas, a Comissão de Estudos Políticos da OAB/CE e a Comissão de Políticas Públicas sobre Drogas da OAB/CE conclamam o governo federal a revogar o decreto n° 9.759, de 11 de abril de 2019, ou ao menos revê-lo no sentido de conferir-lhe maior transparência e clareza, até para que a sociedade possa emitir juízo adequado sobre os critérios e o alcance da extinção dos órgãos.

Fortaleza-CE, 14 de maio de 2019.

COMISSÃO DE ESTUDOS POLÍTICOS DA OAB/CE COMISSÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS DA OAB/CE