DESUMANIZAÇÃO  DO  TRABALHO

Paulo Maria de Aragão (*)

 

Na Alemanha, já no início do século passado (1920), criava-se a sociologia da empresa. As relações de trabalho após o primeiro conflito mundial passaram a ter outro sentido, função social já conhecida pelos executivos da época. Aqui, estamos no início da primeira metade do Século XXI, ao passo que, poderosos empregadores só perseguem o lucro a qualquer preço, buscando acumular a produção capitalista.

 

O cenário tem conotação com as falências da Transbrasil, Vasp e Varig quando seus milhares de servidores foram despedidos como se fossem mercadorias, até hoje penando para receber créditos trabalhistas que se arrastam pelo judiciário. E os gestores responsáveis pela quebra onde e como estão? A crise nesse setor, considerado estratégico, mais uma vez, manifesta-se: a TAM anuncia o corte de 146 comandantes, 190 co-pilotos e mais de quatro centenas de comissários de bordo, num total de 811 aeronautas.

 

O espectro do desemprego reedita-se, mesmo ante a desoneração da folha de pagamento das empresas de transporte a partir de 2014 (MP 612/2013); outrossim, já contempladas em alguns estados com a redução do ICMS do combustível. Por ironia, a MP visa incrementar à mão de obra, à ampliação e renovação da frota, à segurança e treinamento de trabalhadores. Desse modo, mais aeronautas deverão cumprir o “exílio” nos ares da China, da Índia e noutros cantos do mundo.

 

A propósito, J. Kenneth Galbraith, em sua “Anatomia do Poder”, escreve: “O homem de negócios de razoável instrução não mais emprega trabalhadores para aumentar o seu lucro; seu objetivo mais profundo é proporcionar empregos, fomentar o bem-estar da comunidade e assegurar o êxito do sistema da livre iniciativa”. Não é utopia, mas dispensar ao trabalhador motivação e respeito, além de dever, significa transformá-lo numa fonte geradora de progresso.

 

Sem humanização e sem o estreitamento dos laços que devem unir os componentes de uma empresa fomentam-se animosidades. Dessa forma, se fazem reféns do emprego, temerosos de perdê-lo, submetendo-se a situações humilhantes, além de aceitarem a violação de seus direitos. Nessa ambiência de exploração implícita como se falar em social através do trabalhador?

 

A propósito, de iniciativa do Senador Cristovam Buarque, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado no Congresso Nacional aprovou a PEC 19/2010, propondo nova redação ao art. 6º da CF/88.  na qual os direitos sociais seriam essenciais à busca da felicidade (sic), cabendo ao constituinte derivado esclarecer que sem essas garantias mínimas ninguém poderia ousar declarar-se feliz neste país. A felicidade, fim da natureza humana é anseio natural de todos bastando para isso a efetivação dos direitos sociais já assentes no citado art. 6º, prescindindo de inovações. 

 

O processo de conhecimento provém de verdades universais. Uma delas é a de que o capital não sobrevive sem o trabalho e este sem aquele. Relação simbiótica que desfeita põe termo à alegria e à dedicação pelo ofício. Nenhuma pessoa pode ser objeto de comércio, ter descaracterizada sua identidade de ser integral e reduzida a uma dimensão fragmentária e atomizadora.

 

(*) Advogado, professor e membro do Conselho Estadual da OAB-CE.