SÍNTESE DE AÇÕES DO FÓRUM PERMANENTE DE DEBATES E PROPOSTAS CONTRA A VIOLÊNCIA

A Ordem dos Advogados do Brasil-OAB/CE percebendo um visível desconforto social sobre a temática de insegurança pública não hesitou em promover, ainda em novembro de 2013, um seminário para debater o assunto. A programação do encontro incluiu, também, a participação do secretário de Segurança do Estado do Ceará, Servilho Paiva; do secretário de Segurança e Defesa do Estado de Pernambuco, Wilson Salles Damázio; do ex-procurador geral da República e advogado da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Aristides Junqueira Alvarenga.Dali inúmeras idéias surgiram, dentre as quais a da criação de um Fórum de discussão em nosso Estado.

Amadurecido o projeto com a Diretoria e Conselho Seccional eis que no dia 24 de março do fluente ano a OAB-CE lançou o Fórum Permanente de Debates e Propostas contra a Violência.

Na sua instalação diversas entidades e associações profissionais se fizeram presentes apresentam um diagnóstico de carências estruturais e de efetivo. Exemplificadamente estiveram na OAB-CE representantes da Associação Cearense dos Magistrados-AMC, da Associação Cearense do Ministério Público-ACMP, da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Ceará, do Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Ceará e da Associação dos Delegados de Polícia do Estado do Ceará-ADEPOL, além de Representantes da FACIC, CIC, Sindpaes e outros segmentos sociais.

Além de se discutir acerca dos graves e elevados índices de violência no Estado, propostas de políticas públicas de enfrentamento do problema já foram anunciadas.

O advogado criminal Leandro Vasques, que é Mestre em Direito Penal pela UFPE e Professor da Pós Graduação em Processo Penal da UNIFOR, foi designado pela presidência para ser o Coordenador do Fórum. Vasques também compõe a Diretoria do Conselho Estadual de Segurança Pública onde representa a OAB-CE e, também, é Vice Presidente do Conselho Penitenciário do Estado e, neste azo, sintetiza algumas medidas inadiáveis suscitadas na abertura do Fórum e que precisam ser enfrentadas pelo Estado no escopo de equacionar o preocupante cenário que aflige o Estado do Ceará.

Inicialmente importa dizer que a violência é um primitivo fenômeno social e, portanto, as refregas e desinteligências sempre existiram e haverão de co-existir entre os homens. Não por acaso, no tocante à criminalidade violenta, a ONU admite como tolerável um índice de 10 homicídios para cada 100 mil habitantes. Fortaleza, para que se tenha uma idéia, ultrapassou as 70 mortes para cada 100 mil habitantes. Enquanto o Canadá, um país modelar, no ano de 2012 registrava 500 homicídios em um ano, o Brasil computava 50 mil.

Resta indisfarçável, e importa se reconhecer, que o atual governo do Estado do Ceará foi o que mais investiu em segurança na história recente de nosso Estado. Reformulou e reconstruiu (com significativas ampliações) a perícia forense, criou a Academia de Segurança Pública, adquiriu novos equipamentos e viaturas, edificou mais de delegacias pelo interior, mas cometeu derrapagens comprometedoras. O Ronda do Quarteirão nasceu como uma luminosa idéia, mas desvirtuou-se e sua execução causou ciumeira intestina, previu soldos diferenciados, desarmonizou os quartéis. A paralisia sofrida pelo Estado quando do episódio do motim da PM no átrio de 2012 ainda rende, pois alimentou silenciosamente o ferimento à disciplina interna. A idéia de se unificar numa mesma sede a formação de policiais civis e militares não refletiu bons resultados. Roubos a veículos cresceram 61% no primeiro quadrimestre de 2013 no Ceará. Em sete anos de governo o número de homicídios dolosos cresceu mais que 100%. As esquinas da capital são impiedosamente atingidas por uma hemorragia jamais vista. O interior vive uma epidemia de explosões a agências bancárias.

Paralelo a esse apocalíptico cenário, estudiosos da seara da Segurança Pública questionam: Como é possível se debater segurança quando não se possui, sequer, um efetivo adequado? O contingente de PM´s em nosso Estado gira em torno dos 16 mil homens, quando seriam necessários, pelo menos, 35 mil. Há quase uma década não se via concurso para tenentes (recentemente o Estado anunciou um). Já nossa polícia civil, a polícia investigativa, atrofiou. Na década de 80 a polícia judiciária (responsável pela investigação) possuía quase o triplo de efetivo se comparada a de hoje (cerca de 2.700).

Parece-nos, como proposta inicial e inadiável a prioridade, juntamente com a remuneração digna, seria equacionar o número de policiais por habitante. Uma solução aritmética.

Inobstante o denodo e dedicação dos atuais gestores, resta inquestionável que os elevadíssimos índices de violência registrados no Ceará demandam uma inadiável reformulação da estratégia de segurança pública. Urge a adoção de uma verdadeira “política de Estado”, pois a “política de governo” nesse tema fracassou.

Dessa forma, para que se descortine um horizonte mais otimista, faz-se necessária uma nova concepção, não pela mera expressão da falta de preparo dos gestores, mas como reconhecimento dos maus resultados até então experimentados, por isso que a Ordem dos Advogados do Brasil, trincheira cívica que é da sociedade, se propõe a contribuir para essa providencial e necessária discussão, residindo justamente ai a razão de ser deste FÓRUM, que nasce no viso de organizar um grande e providencial evento “permanente” onde a Segurança Pública possa ser debatida por estudiosos, operadores do Direito, profissionais de segurança, vítimas, cidadãos comuns, sociedade, enfim: ouvir experiências exitosas de outras localidades, enxergar o papel que os municípios podem ter nesse cenário, avaliar a política de segurança estadual, aprofundar o debate sobre o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciaria, dentre outros enfretamentos e, principalmente, apresentar PROPOSTAS.

A OAB, secção Ceará, coloca-se, assim, sentinela a debater o tema que tem pautado o dia a dia do cearense, no viso de colaborar para a transformação desse cenário que tem causado amargo desconforto a toda população, seja da capital, seja do interior. O momento é de união por soluções e não de se associar ao pânico e ao terrorismo social que segmentos daninhos buscam amplificar ao alimentarem essa inoportuna atmosfera de medo.

Assim, o FÓRUM PERMANENTE DE DEBATES E PROPOSTAS CONTRA A VIOLÊNCIA, se reunirá, doravante, todas as Segundas, às 11:30h, no plenário do Conselho Seccional da OAB, na Rua Lívio Barreto, 668, Joaquim Távora, desde já elencando algumas propostas apresentadas em sua abertura, nada data de 24 de março de 2014.

Abaixo seguem tópicos que buscam sintetizar as demandas de algumas das categorias que atuam na órbita da estrutura de segurança pública e sistema de justiça (Magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública).

I)                    Polícia Civil

Dentre outras problemáticas, por hora não abordadas, a Polícia Civil do Estado enfrenta uma grave e aguda crise de desvalorização salarial e carência em seu efetivo. Em 1980, o efetivo da classe era de mais de 6 mil (seis mil) policiais civis. Atualmente, apesar dos crescentes índices de criminalidade em proporções exorbitantes, o efetivo demonstra-se insuficiente, tendo em vista que atualmente são 315 delegados, 634 Escrivães e 1607 Inspetores, totalizando 2.576 (dois mil quinhentos e setenta e seis) policiais no Estado.

Também existe uma considerável quantidade de presos confinados nas delegacias da capital e interiores do Estado,desviando a polícia judiciário de sua verdadeira e nobre finalidade: investigar. Assim, o baixo efetivo de policiais civis, além de suas funções previstas em lei, cumprem as vezes de agentes penitenciários. Os presos se alocam em celas desapropriadas e sem os mínimos recursos, sem se perder de vista para uma inadiável discussão acerca da verba remuneratória dos policiais civis (inspetores, escrivães, legistas e pessoal do setor administrativo)

II)                  Polícia Militar

A ONU sugere que para cada fração de 250 (duzentos e cinquenta) habitantes, deverá haver um policial, ou seja, cada policial “abrangeria” a segurança de um habitante. Diante disso, infere-se, sem esforço, que o Estado do Ceará encontra-se muito aquém do recomendado: o efetivo é de 16 mil (dezesseis mil) policiais, enquanto a necessidade/demanda de segurança ostensiva, – função primeira da polícia militar –, clama por 35 mil (trinta e cinco mil) policiais.

Assome-se a isso o drama de por quase uma década não ter havido concurso para tenente oficial (dado superado com o anúncio de um recente edital), além da insatisfação e desmotivação da tropa com o acanho soldo remuneratório.

III)                Magistratura

Há uma carência de efetivo de 106 (cento e seis) magistrados e 230 (duzentos e trinta) servidores, agravado esse diminuto quantitativo pessoal, tendo em vista que 80% dos servidores são cedidos para prefeituras e comarcas municipais.

IV)               Ministério Público

Resta-se demonstrado que há uma carência de 144 (cento e quarenta e quatro) promotores e 600 (seiscentos) servidores. Outro dado alarmante é que apenas 8% dos inquéritos policiais de homicídios chegam à autoria delitiva.

V)                 Defensoria Pública

O déficit de defensores públicos também acarreta prejuízo à segurança pública, sendo, em um número extenso em dígitos e prejuízos, de 290 (duzentos e noventa) defensores. Tem-se o efetivo de 436 (quatrocentos e trinta e seis) profissionais, diante de uma necessidade/demanda de 726 (setecentos e vinte e seis). Ressalta-se salientar, ainda, que 73% das comarcas em nosso estado não possuem defensores públicos.

Em suma, tem-se notório déficit de efetivo profissional em TODAS as categorias que se vinculam ao resultado alcançado (ou pretendido) de estrutura de segurança pública e demanda judiciária, onde a segunda interfere, indubitavelmente, na primeira. Em uma síntese do que fora explanado, eis a estatística aproximada da carência desses profissionais:

Categorias policiais Efetivo atual no Estado do Ceará Efetivo necessário Déficit no efetivo

Polícia Civil

2.576

4.500

1.924

Polícia Militar

16.000

35.000

20.000

 

Categorias do sistema de justiça

Déficit de magistrados Déficit de servidores

Magistratura

106

230

Ministério Público

144

600

Defensoria Pública

290

 

Resta-se demonstrado que há carência de profissionais nas mencionadas categorias, entretanto, além do efetivo, é necessário vislumbrar questões outras que foram debatidas e deverão ser enfrentadas.

Ademais, algumas PROPOSTAS INICIAIS:

1-      Criação de Secretarias de Segurança Pública Municipal nas cidades que possuam mais de 30 mil habitantes. Apenas 09 municípios cearenses possuem esse equipamento.

2-      Equacionar o efetivo da polícia civil e militar conforme a carência demonstrada.

3-      Deliberar sobre aumento escalonado nos vencimentos de ambas as policias – militar e civil.

4-      Realizar concursos públicos para a defensoria pública, ministério público e magistrados.

5-      Alertar a magistratura acerca da aplicação do artigo 319 do Código de Processo Penal, trazido pela Lei Federal 12.403/2011 e que concebeu as medidas cautelares alternativas à medida segregadora.

6-      Urge o remanejamento imediata de todos os presos custodiados nas delegacias para que se “devolva” o já ínfimo número de policiais civis à sua função precípua de investigação.

7-      Aperfeiçoar a comunicação entre a policia civil e polícia militar : Integração sem invasão das esferas de competência de cada força policial.

8-      Afinar contato e estabelecer parcerias entre Universidade (Laboratórios de Estudos da Violência) e o Estado, elaborando pesquisas e estudos dirigidos em busca de dados estatísticos e soluções na esfera da segurança pública.

9-      Implementar uma Política de Promoções e Valorização Profissional na Polícia Civil.

10-   Aperfeiçoar e investir na Política de Promoções da Polícia Militar.

11-   Propor maior agilidade do judiciário e do MP na apreciação e deferimento das medidas cautelares requeridas pela Autoridade Policial. Atualmente, existem representações que são apreciadas meses depois que foram interpostas, perdendo assim o princípio da oportunidade.

12-   Criação de Conselhos Comunitários e, aproximação dos já fundados, a fim de trabalhar conjuntamente à polícia civil e militar.

13-   Elaborar uma cartografia da criminalidade e da violência no Estado do Ceará com a finalidade de subsidiar políticas públicas de prevenção e repressão.

14-   Investimento e incremento do Departamento de Inteligência Policial para dotá-lo de maiores subsídios de apurar delitos de maior complexidade.

15-   Investigação do Ministério Público frente às ações de organizações criminosas que atuam em vínculo e intercâmbio interestadual e internacional.

Estas são, em suma, algumas das discussões e propostas já travadas na abertura do FÓRUM PERMANENTE DE DEBATES E PROPOSTAS CONTRA A VIOLÊNCIA, que prossegue em suas reuniões a todas as Segundas, às 11:30h, no plenário do Conselho Seccional da OAB, na Rua Lívio Barreto, 668, Joaquim Távora. 

Fortaleza, 27 de março de 2014. 

Cons. LEANDRO DUARTE VASQUES

Coordenador do FÓRUM PERMANENTE DE DEBATES E PROPOSTAS CONTRA A VIOLÊNCIA