Assis Chateaubriand, então desquitado, em litígio pela guarda da filha, Teresa, registrada apenas com o nome da jovem mãe Cora Acuña, recebera intimação do juiz substituto da 4ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio de Janeiro, Elmano Cruz, para devolvê-la. Durante a audiência, deu-se mal ao afrontar o magistrado, pois o meritíssimo se recusou terminantemente a mudar o seu despacho e ordenou que ele saísse da sala.

Endiabrado, Chatô, aos berros, reagiu: ”Eu posso não ter o direito, seu juizinho de merda, mas tenho algo mais importante: tenho razão! Sua carreira terminou hoje, aqui, agora. […] Se o senhor está pensando que vai ser desembargador, juiz do tribunal, pode tirar o cavalo da chuva. Sua carreira acaba hoje! E saiba que seu despacho vai ser anulado, seu juiz de merda!” – relata-nos Fernando Morais na obra “Chatô, Rei do Brasil”. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

Assim, restou-lhe sair de afogadilho a fim de não ser preso por crime de desacato. O juiz Elmano Cruz atuava como substituto de Nelson Hungria, então de férias, o qual na condição de amigo de Chatô obrigou-se a interrompê-las e logo ao tornar à 4ª Vara anulou o despacho do Dr. Elmano. Este deixou o timbre da independência e altivez ao passo que o jurista Hungria, a mácula da submissão a um poderoso.

Chatô, jornalista, empresário, mecenas e político foi um reformador polêmico e audaz de uma época. O demiurgo queria que a ele todos se curvassem sob pena de sofrerem reveses. O seu entrevero com Corita não foi fácil, pois se enredava em paixão e ciúme – affaire entre um homem de 45 e uma adolescente de 15 anos, a qual a teria seduzido no desabrochar de suas “15 primaveras”, mantendo-a sob intensa vigilância.

Contudo, jamais abriu mão da guarda da filha. Obteve de Getúlio Vargas o D.L. nº 4.737, de 24.9.42, ao permitir o reconhecimento, seguido ao desquite, de filhos havidos fora do matrimônio. Mas, só reconheceu Teresa depois de conseguir, à custa de insistências, dois diplomas que tornaram possível à justiça conceder-lhe o pátrio poder e a guarda – diplomas que ficaram conhecidos como Lei Teresoca.

Neste episódio, méritos creditem-se ao juiz Elmano Cruz pelo desempenho magnífico com que se houve em respeito à lei. Preceito, lamentavelmente, baldado pelo jurista Nelson Hungria em função das relações de amizade com Chatô, um dos homens públicos mais influentes do Brasil nas décadas de 1940 e 1960, oPríncipe dos Penalistas Brasileiros.

(*) Paulo Maria de Aragão é advogado e professor, membro do Conselho Estadual da OAB-CE e titular da Cadeira de Nº 37 da Academia Cearense de Letras Jurídicas (ACLJ).

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