Por Gilvando Figueiredo Junior e Gustavo Rebelo de Campos

No dia 29 de abril de 2020, o plenário do Supremo Tribunal Federal proferiu uma decisão liminar – em Ação Direta de Inconstitucionalidade – na qual o ordenou a suspensão da eficácia do artigo 29 da Medida Provisória nº 927, que direcionava ao empregado o ônus de comprovar que eventual contaminação com a Covid-19 ocorreu durante o exercício de seu trabalho, para fins de ser considerada doença ocupacional.

É bem verdade que se trata apenas de uma decisão liminar, mas acreditamos que é muito provável que a mesma seja confirmada quando do julgamento do mérito da referida ADI, de modo que sugerimos que as medidas sugeridas no presente texto sejam levadas em consideração desde já.  

Em miúdos, tendo em vista esse entendimento, caberá ao empregador ter máxima cautela e esmero no gerenciamento dos protocolos de higiene e utilização de equipamentos de proteção individual por seus colaboradores, tudo isso sob pena de poder o mesmo ser mais facilmente responsabilizado por eventual contágio de funcionário pelo Covid-19.

É que, conforme essa decisão do STF – da qual resultou a suspensão liminar do artigo 29 da Medida Provisória nº 927 – caberá ao empregador o ônus de comprovar que houve a adoção de todas as medidas de segurança, medicina e higiene do trabalho, a fim de conter contaminação e propagação do novo vírus, sob pena de poder, a depender do caso, ser configurada a eventual contaminação como uma doença ocupacional. Se isso ocorrer, o empregador poderá ser compelido a arcar com reembolso de gastos com remédios, despesas médicas e hospitalares do funcionário; além de, eventualmente, numa medida mais drástica, a arcar com pensão civil e com danos morais (a depender de cada caso).

Ademais, se configurada a doença ocupacional, poderá haver a concessão de benefício de auxílio doença acidentário, justificado na incapacidade do empregado de exercer seu trabalho, além de beneficiar o obreiro, após sua integral recuperação, com estabilidade provisória no emprego.

Num cenário como esse, com a reabertura da economia e respectiva retomada das atividades que deve ocorrer gradualmente em breve, caberá às empresas – mais do que nunca – adotarem algumas medidas jurídicas preventivas, bem como vários protocolos de ordem sanitária; não somente para evitarem que seus colaboradores se contaminem com o Covid-19 durante o exercício de suas funções (incluindo o trajeto casa-trabalho-casa); mas também para se precaverem de eventuais percalços judiciais futuros que poderão ocorrer nesse momento de adaptação à nova realidade do mundo durante a pandemia.

Sendo assim, dentre vários cuidados que deverão a fazer parte do contexto diário das empresas, passará a ser de extrema importância que as mesmas passem a ter uma maior preocupação com a identificação de eventuais riscos da sua atividade empresarial; bem como passem a fornecer, rotineiramente, equipamentos de proteção individual (EPI’s) com o intuito de diminuir os riscos de contaminação do Coronavírus. 

Também julgamos ser importante que as empresas avaliem a possibilidade de se utilizar de algumas medidas alternativas para execução das suas atividades, tais como a utilização do sistema home office para parte (ou mesmo para o total) de seus colaboradores; a estipulação de escalas de trabalho, rodízio de equipes de trabalho etc; sem olvidar, ainda, de orientar os seus funcionários acerca do uso correto e regular dos equipamentos que foram fornecidos; assim como sobre os cuidados de higiene que devem passar os mesmos a ter, além de fiscalizar o cumprimento de tais regras. 

Essa nova realidade nos mostra uma nova faceta no âmbito do Direito do Trabalho, na medida em que se prevê uma verdadeira estipulação de obrigações bilaterais: para o empregador, que deverá oferecer condições de trabalho condizentes com os protocolos de saúde previstos pela Organização Mundial de Saúde (OMS); e também para o empregado, que deverá observar a regular e boa utilização dos equipamentos de proteção que lhe forem fornecidos e atender aos novos e rigorosos hábitos de higiene adotados mundo afora.

Preventivamente, vislumbramos ser salutar a celebração de aditivos aos contratos de trabalho que prevejam essas novas obrigações que farão parte da relação laboral; bem como o preenchimento diário de fichas de entrega de equipamentos de proteção individual, declarações diversas e a respectiva fiscalização de uso desses utensílios; a realização de treinamentos que visem demonstrar a correta forma de utilização de tais equipamentos e a ensinar os cuidados de higiene e protocolos de saúde previstos pela Organização Mundial de Saúde; não somente durante o exercício das atividades profissionais, mas também, por cautela máxima, mesmo fora do contexto da empresa

Elencamos adiante algumas medidas que julgamos serem importantes as empresas adotarem com o intuito de diminuir os riscos de contágio durante o exercício das atividades dos seus funcionários, bem como para que possam as mesmas se resguardarem em caso de questionamentos trabalhistas futuros (administrativos e judiciais) acerca dessa problemática. Vejamos:

– Identificar e mapear os eventuais riscos de contágio existente na atividade econômica exercida pela empresa, para fins de melhor gerenciamento e adoção de possíveis diagnósticos de controle;

– fornecer diariamente ao empregado todos os equipamentos de proteção individual (EPI’s) necessários para diminuir os riscos de contaminação e ter o respectivo controle diário de entrega;

– ministrar instruções básicas de utilização dos referidos equipamentos de proteção; fiscalizar o cumprimento das referidas diretrizes de higiene pelo obreiro, advertindo-o quando de eventual descumprimento; 

– afixar, no ambiente de trabalho, as determinações e as recomendações da Organização Mundial da Saúde no combate e na prevenção de contaminação da Covid-19.

– a depender da natureza da atividade empresarial e se possível for, direcionar parte do quadro de funcionários para atuar no sistema de trabalho home office;

– estabelecer escalas de trabalho e rodízios de funcionários, nas empresas com maior número de colaboradores;

– Prestar orientações sobre uso adequado do álcool gel, considerando seu risco de combustão, que produz chamas invisíveis e pode causar acidentes e queimaduras no corpo;

–  Determinar a utilização permanente de máscara durante o horário de trabalho, bem como nos deslocamentos (trajetos casa-trabalho-casa);

–  Evitar o compartilhamento de equipamentos, ferramentas e objetos de uso pessoal entre os trabalhadores;

–  Determinar a troca diária e não compartilhamento dos uniformes;

–  Sempre que possível, o Empregador deve fornecer ao trabalhador, sem custo financeiro, kits de higiene contendo sabonete, álcool gel e outros sanitizantes, para que o trabalhador utilize no trabalho e o oriente a replicar essa utilização em casa.

–  Orientar o obreiro a evitar aperto de mão ou abraço;

–  Orientar o obreiro a cobrir o nariz e a boca com lenço descartável, ou com o antebraço, ao espirrar e tossir;

– Orientar o obreiro a evitar tocar nos olhos, nariz e boca sem que as suas mãos tenham sido previamente higienizadas com água e sabão, ou álcool gel a 70%;

– Determinar aos funcionários que, durante os horários de descanso, evitem aglomerações; 

– providenciar declarações diversas por meio das quais o obreiro ateste expressamente a adoção de todos os protocolos de cuidados de higiene e saúde pela empresa, bem como a realização de treinamentos e prestação de orientações acerca do tema; e

– Fiscalizar o cumprimento de tais diretrizes pelos colaboradores, advertindo-os quando de eventual desobediência a tais protocolos. 

Por meio de aditivo ao contrato de trabalho, acreditamos, ainda, ser relevante que o funcionário também se comprometa expressamente com alguns cuidados, tais como:

–  O Empregado deve comunicar aos superiores se apresentarem sintomas relacionados à Covid-19; e

–  O Empregado deve prestar informações contínuas sobre as suas condições de saúde, bem como de seus familiares, para identificação rápida dos casos que podem levar às condições de isolamento previstas na legislação;

Como se pode ver, a reabertura da economia e a retomada das atividades irão impor vários desafios de ordem legal e sanitária às empresas. É importante, portanto, que as mesmas estejam preparadas para esse momento que se aproxima; o que, de certa forma, contribuirá para que os efeitos da pandemia sejam melhor gerenciados (e minimizados), como também dará maiores subsídios para que os empregadores não estejam tão expostos aos problemas de ordem trabalhista que podem advir da contaminação dos profissionais. Estar bem assessorado e agir preventivamente fará toda a diferença! 

 

* Gilvando Figueiredo Junior é advogado, inscrito na OAB/CE sob o nº 18.259, com atuação profissional voltada ao Direito Público e Imobiliário. Ocupa atualmente a posição de Vice-Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Ceará.

 

 

 

** Gustavo Rebelo de Campos é advogado, inscrito na OAB/CE sob o nº 35.289, com atuação voltada ao Direito e Processo do Trabalho.