“As novas tecnologias e a chegada da inteligência artificial, esse é um tema que vai impactar a nossa vida por muito tempo e, possivelmente, vai mudar o significado do que é ser humano na Terra”. Assim, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, iniciou sua palestra no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE), realizada na manhã desta segunda-feira (21). Esta foi a primeira vez que a Ordem cearense recebeu a visita de um presidente da Suprema Corte.
Com o tema “Plataformas Digitais, Inteligência Artificial e os Desafios do Mundo Contemporâneo”, o ministro Barroso falou para uma prestigiada plateia de advogados, juristas, magistrados e imprensa sobre o impacto da terceira revolução industrial e os avanços da reforma tecnológica, defendendo a regulação para a proteção da sociedade.
O presidente do STF enfatizou que a democracia depende de um espaço digital vibrante, mas ressaltou que a responsabilidade das plataformas deve existir, especialmente, para combater conteúdos nocivos, como pornografia infantil e discursos de ódio. Para tanto, defendeu uma abordagem equilibrada, com regulação necessária, sem censura.
“Todos os países democráticos, em alguma medida, cuidaram da regulação das plataformas digitais. Primeiro no plano econômico para tributação justa, para impedir a dominação de mercados, para proteger direitos autorais. Em segundo lugar, todas as democracias do mundo praticamente têm uma Lei de Proteção de Dados para a proteção da privacidade das pessoas. E é preciso também, em alguma medida, proteger as sociedades do que se tem chamado de comportamentos coordenados inautênticos e de alguns conteúdos”.

Para Barroso, é necessário regular para impedir a ampliação artificial da desinformação por meio de mecanismos automatizados, de robôs ou da contratação de grupos que amplificam uma determinada mentira para avançar o interesse econômico e político. “No plano jurídico, o que a gente tem que evitar na rede são crimes, sobretudo, crimes graves e que colocam em risco as pessoas e a sociedade de uma maneira em geral“, ressaltou.
Ao abordar sobre o crescimento das plataformas digitais, o ministro ressaltou o impacto da mudança de escala na circulação da informação. Como exemplo, Barroso comparou o alcance do jornal The New York Times, que possui o maior número de leitores do mundo, com 10,5 milhões de assinantes, enquanto o Facebook tem 3 bilhões de seguidores, o Youtube tem 2,5 bilhões de internautas e o whatsapp mais de 2 bilhões de usuários.
Para ele, ao mesmo tempo que a internet democratizou o acesso ao conhecimento, à informação e ao espaço público, também trouxe consequências negativas como a circulação sem filtro das desinformações, de discursos de ódio, assassinato de reputações e teorias conspiratórias, além da “tribalização da vida”, em que as plataformas digitais, auxiliadas da inteligência artificial, ampliam o viés de confirmação.
O ministro destacou o papel do STF no combate à desinformação e na proteção das liberdades fundamentais, expondo iniciativas do Supremo para reduzir processos por meio da cultura de precedentes vinculantes. Destacou o avanço do processo eletrônico no judiciário brasileiro que conseguiu reduzir o prazo médio de um processo de mais de 5 anos para um pouco mais de 3 anos.

E diante dos processos que surgem com a revolução tecnológica, Barroso defende que muitas questões precisam ser decididas por juízes e tribunais antes que haja lei disciplinando a matéria. “Temos que procurar neutralizar as desvantagens sem comprometer a liberdade de expressão, como acho que o Supremo fez e acho que fez bem feito”.
O ministro destacou ainda os inúmeros benefícios que a Inteligência Artificial contribuiu para o avanço e celeridade em diversas áreas. Mas, também chamou atenção para os riscos a curto, médio e longo prazo, como o impacto sobre o mercado de trabalho; a utilização da IA para fins bélicos, como as armas letais autônomas; a massificação da desinformação; violação de privacidade; descriminação algorítmica; infrações de propriedade intelectual e direitos autorais; além da singularidade, em que os computadores, alimentados pela Inteligência Artificial passarão a ter consciência de si e vontade própria.
“A inteligência artificial precisa ser regulada para permanecer numa trilha ética, numa trilha que sirva à causa da humanidade e não faça a vida ficar pior […] E no Direito, que é o mundo que nós habitamos, a sensibilidade humana, ela sempre vai ser imperativa, porque o direito não é uma atividade mecânica”, defendeu.
E concluiu afirmando que, “apesar de todas as modernidades, […] a vida boa, a vida ética, a vida humana que vale a pena ser vivida, vai continuar a ser regida pelos mesmos valores que vêm desde a antiguidade […] que são o bem, a justiça, a busca pela verdade possível no mundo plural, a inclusão de todas as pessoas e a dignidade humana”.
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