Paulo Maria de Aragão (*)

A natureza é pródiga em processos de sobrevivência. Admirável é o fenômeno do mimetismo por meio do qual certos animais safam-se do perigo ou atacam a presa, assumindo parecenças e características do meio ambiente.

No relacionamento humano, esse fenômeno é imitado por falsificação; não importam os meios: acende-se uma vela para Deus, e outra para o Diabo.

Nesse palco metamórfico, no baile das aparências, as mariposas volteiam. Suavemente pousam nas mesas, hábeis no falar sobre a generosidade da alma e a perfeição da virtude.

Movem-se conforme sopra o vento e, quando este muda de direção, acompanham o seu sopro, mudando também a retórica. Tão desprezíveis gestos equivalem a fazer passar moedas de cobre como moedas de ouro. Isso é degradante.

Pela duplicidade de atos, acha-se aí a duplicidade própria da natureza humana, que se exercita mediante exímias encenações. Miméticas mariposas, voláteis e espertas, buscam a luz noturna das reuniões falazes, esquecendo a verdadeira luz da manhã. Será que a claridade do dia as deixa mais sensíveis ao piar das corujas e a outros predadores naturais? Ausentam-se a sabedoria e a autenticidade.

As pessoas querem ser o que não são.  Atributos inerentes à espécie humana, como decência e justiça, a cada dia, caem pelos desvãos do esquecimento, enquanto a irrealidade é vendida em belas embalagens, prosperando a mentira e o fingimento

A vida continua, rareiam os autênticos apóstolos do bem. É a época da subversão de valores. Parece que a verdade só é conhecida na linguagem poética, porquanto os ditos humanos só imitam a parte boa dos animais para desvirtuá-la.

Por que não tiram o mesmo proveito e a mesma lição de vida do joão-de-barro, que constrói o ninho como uma bela obra de arte? Da aranha que tece delgados fios? Por que não imitam a lealdade canina e a própria amizade entre animais de espécies distintas?

Ao final, relembro aqui Cazuza: “Pra que mentir/ fingir que perdoou…/ pra que usar de tanta educação, pra destilar terceiras intenções… /Devagarinho, flor em flor entre os meus inimigos, beija-flor”.

(*) Advogado, professor e membro do Conselho Estadual da OAB-CE.