por Vanilo Carvalho*

A todo momento, em qualquer meio de comunicação, em qualquer rede social, todos os dias do ano, nos deparamos com notícias terríveis, com imagens assombrosas de violência, de corrupção, de desrespeitos humanos, que nos faz parecer, tudo, como parte de um contínuo filme de terror, onde nós somos expectadores diários, e muitas vezes somos os protagonistas, por vezes como vítimas, por vezes como algozes.

Exemplos de barbaridades são constantes, as explícitas e as escondidas.

Estas últimas são sofridas especialmente pelos mais pobres, são mais rotineiras, anônimas. Basta contemplar a situação do outro em relação a nossa. Se o trânsito está um caos, imaginem para os que se locomovem de ônibus. Se os hospitais particulares estão cheios, imaginem para os que dependem dos hospitais públicos. Se o Sistema Judiciário é moroso, imaginem para quem não tem condição de contratar um advogado.

De tal forma, que o grande desafio é alimentar a esperança daqueles que já a perderam por experiências vividas e sofridas.

E como iniciar o Ano Novo desta forma? Decididamente deve-se fazer um exercício de contemplação, com profundidade, na riqueza que as celebrações litúrgicas do Advento e do Tempo de Natal nos apresentam.

O Advento é o ponto de partida e o ponto de chegada. É a espera, a espera vigilante: a esperança! Uma espera pelo que já é certo. A certaza de um tempo novo. A certeza de um canto novo, como nos diz o Salmista: “Cantai ao SENHOR um cântico novo, cantai ao SENHOR toda a terra. Cantai ao Senhor, bendizei o seu nome; anunciai a sua salvação de dia em dia.”

Agora de fato o que se espera? Esperamos a Justiça, o Justo. Que é apresentado de uma forma inusitada.

Ele vem sem os valores do mundo consumista, sem os valores do poder do dinheiro e do mundo de aparência. Ele, o Justo, o Juiz, a própria Justiça, vem despojado, nu, na essência, entre os animais, no frio da noite, no contato direto com o sentimento de amor de seus pais (São José e Maria Santíssima). A majestade dele, é para nós, o inimaginável, é um trono feito de palha, é um palácio onde, pelo Mistério da Encarnação, a terra e o céu se encontraram, onde tudo o que para nós é grande, em face do imensurável, ficou pequeno.

E quem foram os primeiros, depois de Seus pais, a reconheceram que estavam diante do Justo? Foram os pastores que ali nas redondezas humildemente estavam. Estes sim foram privilegiados. Viram com os próprios olhos o Mistério. A Epifania do Senhor, recordando o patriarca Moisés ao encontrar-se com o Deus em forma de sarça ardente.

Estes pastores são os nossos representantes, que neste mundo de injustiça, anseiam por Justiça. O Justo veio a nos dizer qual é a Sua Justiça, como bem explicita no Sermão da Montanha ( Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados), e quem será justiçado (Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; Sendo estrangeiro, não me recolhestes; estando nu, não me vestistes; e enfermo, e na prisão, não me visitastes. Então eles também lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos? Então lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim. Evangelho de São Mateus).

O desafio de manter a esperança começa por alimentar a esperança no próximo, especialmente naquele já injustiçado, muitas vezes pela própria condição de nascimento. Sejamos, pois, contempladores do Natal, em Jesus Cristo que é “nosso advogado junto do Pai” (1Jo 2,1), na busca da verdadeira Justiça, que se faz tendo como escopo o bem do próximo e a nossa própria dignidade.

* Advogado, professor universitário, diretor acadêmico da Fesac, integra a Comissão de Ensino Jurídico e a Ordem do Santo Sepulcro.