por Paulo Maria de Aragão*

Juscelino Kubitschek, quando presidente da República, não esqueceu o radioamadorismo. Com a singeleza que lhe era peculiar, falava com todos na sua faixa, PY-2 JKO. Numa dessas comunicações, um indivíduo fez-se de importante, identificando-se pela patente. Juscelino simplesmente replicou: “Companheiro, você aqui não é coronel, porém o cidadão radioamador”. O fato ganhou corpo. Noutra oportunidade, surgiu um graduado que, na tentativa de intimidade com JK, extrapolava ao anunciar-se: “Alô, Juça! Aqui, Botina Preta; somos da irmandade”. Ao que se sabe, Juscelino sorriu e manteve a fleuma.

A cortesia e o sorriso no trato com o povo sempre foi componente de sua personalidade. Na campanha presidencial, tinha a consciência de que ricos e pobres merecem tratamento igual. Em Fortaleza, hospedado na luxuosa suíte do Edifício Jangada, ao entrar no elevador, pisou no pé de um contínuo. Num gesto de simplicidade, pediu-lhe desculpas, indagando o seu nome. De partida para Minas, no dia seguinte, no mesmo elevador, deparou-se com o jovem e, já o chamando pelo nome, acenou-lhe um singular cumprimento.

O exemplo de JK merece ser lembrado nos tempos atuais, em razão inversa ao comportamento prepotente de muitos políticos. O mineiro boêmio e seresteiro ascendeu ao poder sem sede, sem perseguir nem desprezar os menos favorecidos, notabilizando-se nas fases ascendente e descendente da vida pública. Não perseguiu adversários, a exemplo dos militares revoltosos de Aragarças; ao contrário, desarmou-os, concedendo-lhes anistia.

Pela República passaram vários presidentes civis e militares, mas nenhum teve o carisma para seguir as pegadas sensatas e modestas do ilustre brasileiro. Collor, nos palanques, ousou, numa vã tentativa, imitar Kubitschek, com o apoio da própria Dona Sara. Felizmente a máscara caiu e, com ela, a arrogância do “caçador de marajás”.

(*) Advogado, professor e membro do Conselho Estadual da OAB-CE.