Por Janayna Lima*

Em recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, dia dezenove de fevereiro de 2014, foi constitucionalizada a cláusula de reserva de barreira nos concursos públicos, também conhecida como cláusula de exclusão ou cláusula de desempenho. Pode-se dizer que essa norma foi criada para impedir ou restringir o funcionamento parlamentar ao partido que não alcançasse determinado percentual mínimo de votos.

O dispositivo foi aprovado pelo Congresso para ter validade nas eleições, mas foi considerado inconstitucional pela unanimidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), sob o argumento de que prejudicaria os pequenos partidos, ferindo o direito a livre manifestação das minorias. Aplicada em analogia no direito administrativo, nas provas de concursos públicos, seria uma cláusula para limitar o número de aprovados entre as diversas fases do concurso, restringindo seu acesso às próximas fases do certame pelos critérios de maiores notas ou outros explicitados em edital, mesmo que o concursando tivesse atingido o perfil para ser considerado aprovado para a fase seguinte. Fundamentam-se os doutrinadores que defendem a cláusula de reserva de barreira no princípio da igualdade e impessoalidade nos concursos públicos, com o fim de que somente os melhores candidatos logrem êxito na prova.

No Recurso Extraordinário 635.739, apresentado pelo poder executivo estadual de Alagoas contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado, ficou reconhecida a repercussão geral, por tratar de princípio sobre isonomia nos concursos, onde o interesse público sobrepõe-se ao particular, ou seja, do candidato. Sustenta a tese que a cláusula de barreira no concurso não fere o princípio da isonomia, mas sim, consegue avaliar o candidato mais preparado para a vaga.

Ocorre que o concurso público, assentado no artigo 37, II da Constituição Federal, também tem como base os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, dentre outros elencados em nossa constituição.

Preleciona o princípio da eficiência que a administração pública deve procurar a melhor forma possível para aplicação dos recursos e meios mais benéficos para a sociedade, de maneira a evitarem desperdícios e garantir maior rentabilidade social. Assegurado nesse princípio, o Concurso Público também deverá ter meios mais céleres e que busquem maior efetividade nos resultados de seus certames.

Sendo assim, devemos ressaltar que com a constitucionalização e regularização da cláusula de barreira, restará prejudicada uma margem de proporção de aprovados para o número de classificáveis no concurso para as vagas que normalmente surgem no decorrer do tempo previsto no edital, como os casos de aposentadoria de servidores, desistência ou transferência de cargos e empregos públicos. É importante lembrar que os classificáveis ou reserva de vagas são salutares para a administração pública, pois a deixa com uma margem ou percentual de aprovados para serem aproveitados no transcorrer do tempo de validade do edital.

Sabe-se ainda, que a maioria dos concursos ainda traz – mesmo após a nomeação – um período de avaliação, para que o servidor obtenha a estabilidade, podendo nesse período ser demitido ou exonerado do cargo ou emprego público.  Portanto, não é eficiente que não seja aproveitado um maior número de candidatos que lograram êxito na prova.

Ainda lembrando que o Concurso Público tem como princípio, o direito à empregabilidade, tal ato também poderia ferir o princípio da dignidade da pessoa humana, pois os candidatos não prosseguiriam nas fases seguintes do concurso, tolhendo-os um direito fundamental, quando o Estado não considera e não respeita o esforço do cidadão.

É preciso deixar claro que o objetivo do Concurso Público seria buscar os mais capacitados para servir o Estado, sem que passe pelos auspícios do “rei”.  Essa ferramenta veio para desburocratizar as máquinas do Estado, colocando pessoas que estivessem mais preparadas intelectualmente e emocionalmente, dispostas a cumprir a função sem o pedido de seu “padrinho”.

Com esse entendimento, conclui-se que houve uma regressão nos direitos dos concursandos. E é importante ressaltar que na mesma semana, a 2ª turma do Superior Tribunal de Justiça  entendeu que é possível a revisão judicial de um concurso, mesmo após sua homologação. Verifica-se que a evolução dos direitos dos concursandos sempre é fiel ao respeito dos valores humanos e sociais, avançando sempre nos quesitos protetivos aos princípios basilares constitucionais, mas infelizmente a cláusula de barreira torna-se apenas um critério excludente, que os remete às priscas eras medievais em Esparta, onde só os mais fortes venciam.

Não foi essa a intenção quando o concurso público foi criado. Buscar o mais capacitado, sim; mas nunca com critérios humilhantes, degradantes, desproporcionais ou de rigor exacerbado.

* Janayna Lima é advogada, presidente da Comissão de Acompanhamento de Concurso Público e Processo Seletivo da OAB-CE, conselheira estadual e diretora da Associação dos Advogados do Ceará-AACE.