leandro-vasquesOs massacres ocorridos em unidades prisionais não são nenhuma novidade no Brasil. São mais que intermitentes: são permanentes como a reincidência que caracteriza os elevados índices de violência que a população brasileira amarga – desde sempre e cada vez mais.

O leitor menos atento – e menos afeito aos imprescindíveis direitos humanos – pode fantasiar que a morte de detentos representa “menos bandidos” na sociedade e que os pandemônios havidos nos calabouços do sistema carcerário não o afetam. Ledo engano. Os apocalipses prisionais são, na verdade, o sintoma mais evidente da total falência do sistema penitenciário brasileiro, que deveria exercer importante papel na pacificação social que se espera. Um sistema que só embrutece e degenera, mais cedo ou mais tarde, acaba expelindo de volta aqueles que perpetram a violência que sofremos diariamente. Sim, leitor, quem hoje se vê confinado no medieval sistema prisional cedo ou tarde regressará à sociedade.

Assim, diante de uma crise dessa magnitude, mudanças significativas passam a ser discutidas e gestadas, dentre as quais a adoção de modelos de terceirização e de cogestão do sistema prisional. Na prática, destina-se a administração das unidades penitenciárias ao setor privado, que, como não poderia deixar de ser, passa a lucrar com o aprisionamento humano. A lógica é simples: quanto mais presos, mais lucro.

Nos idos de 2003 e 2004, o Ceará já experimentou tal modelo, o qual foi veementemente criticado por diversos órgãos ligados ao âmbito penitenciário (um dos quais presidido por mim naquele tempo: o Conselho Penitenciário) evidenciando-se, além da incompatibilidade da atividade de execução penal com a lógica de mercado, a vulnerabilidade do sistema, que poderia ser financiado pelas próprias facções criminosas cada vez mais organizadas e ousadas, com tentáculos estendidos por todo o território nacional.

Nesse cenário dantesco, os indivíduos continuariam sendo tragados irreversivelmente por um círculo vicioso permeado pelo mais absoluto ócio, que só pode ser fraturado por uma política de Estado – e não meramente de governo – que estabeleça, por exemplo, rotinas de estudos, trabalhos e ocupações diversas para os internos, adotando a disciplina e a ordem como instrumentos de rotina.

Sem educação e trabalho nas unidades prisionais, o ócio esplêndido só contribuirá para a inutilidade do sistema.

Leandro Vasques
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Advogado criminal, mestre em Direito pela UFPE, presidente do Conselho Estadual de Segurança Pública e conselheiro da Escola Nacional de Advocacia (ENA)