O Brasil ultrapassou a inacreditável quantidade de 516 mil óbitos por covid-19. Isso mesmo: mais de meio milhão de mortes.
Somos o segundo país com maior número de falecidos e o terceiro em infectados pelo coronavírus no mundo.
Não são apenas números. São pessoas. Pais, mães, filhos, parentes, amigos, colegas e conhecidos.
Todas vítimas de uma pandemia que poderia ter sido combatida com eficácia acaso a aposta nos negacionismos e no charlatanismo não fosse transformada numa política de governo.
Parece óbvio, mas para desnaturalizar essa tragédia nacional tenho me socorrido de simples comparações com o objetivo de demonstrar que as marionetes de “fake news” menosprezam as vidas humanas.
Por ignorância ou má-fé não param para refletir sobre o que representam essas mortes para além da dor e do luto de quem perdeu pessoas queridas.
Deveriam fazer contas simples. Por exemplo: 500 mil óbitos são 100 conjuntos de 5.000 pessoas mortas ou de caixões.
Significa a queda de 2500 aviões comerciais entre 2020 e 2021: uma média diária de 9 desastres aéreos.
Imaginemos: as mortes por coronavírus se assemelham a quantas catástrofes da derrubada das Torres Gêmeas (EUA), dos rompimentos das barragens de Mariana e de Brumadinho, este considerado o “maior acidente de trabalho no Brasil em perda de vidas humanas e o segundo maior desastre industrial do século com 270 mortos, incluindo 10 desaparecidos”? Simbolizam quantos acidentes aéreos que envolveu o time da Chapecoense?
Imagino que a não visualização dos corpos sem vida ajuda nesse perverso processo de insensibilidade capitaneado por aqueles que são responsáveis por essa barbárie.
Muitas vezes ou quase sempre, a imagem é tudo. Vivemos uma espécie de “banalização do mal” (Hannah Arendt).
Entre deboches e ironias, mentiras e canalhices e até de imitações de pessoas sufocadas, seguimos em frente como se a vida não tivesse valor algum ou nada estivesse acontecendo ao nosso redor.
Precisamos recuperar a nossa capacidade de solidariedade diante da dor do outro. O que nos faz humano é a nossa dignidade.
Na sua “Fundamentação da Metafísica dos Costume”, Imannuel Kant, nos ensinou que tudo em nossa existência tem um preço ou um valor. Quando algo tem preço ele é negociável e pode ser trocada por outra coisa. Quando algo não pode ser precificado ou trocado por outra coisa, ele tem valor.
Isso caracteriza a vida humana. Esta é um valor em si mesmo e não deve ser banalizada e jogadas fora como se fosse um mero objeto.
Mais de 500 mil vidas humanas foram descartadas por comportamentos e decisões políticas baseadas em escolhas irresponsáveis e criminosas.
Os negacionismos da pandemia e da ciência influenciaram diretamente para alcançamos esses resultados mortais. Nada disso pode ser relevado ou esquecido em face das denúncias sobre corrupção, desvios ou prevaricação.
A sociedade e as instituições republicanas devem promover as responsabilizações política, civil e criminal de todos aqueles que contribuíram para esse genocídio.
É o mínimo que podemos fazer pelas pessoas que partiram cedo demais.
Clique aqui e confira o artigo publicado pelo jornal O Povo.
André Costa, conselheiro federal da OAB pela bancada do Ceará.