É com profundos pesar e surpresa que lemos a matéria de uma revista semanal, nos últimos dias, que está sendo repercutida em vários outros meios de comunicação, na qual faz-se um relato de como seria a vida de advogados criminalistas que atuam em defesa de acusados de crimes complexos como corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa etc, aqueles que atraem a atenção da imprensa nacional.

Pelo relato da revista, a vida desses advogados, a qual acompanho há décadas — desde que nasci meu pai já era advogado criminalista, assim como a maioria de seus amigos com quem convivi e anda convivo por eu ter escolhido há 20 anos seguir essa mesma carreira — seria de luxúria, fama, ostentação, e incentivadora dos atos ilegais que seus clientes teriam cometido, até mesmo servindo de instrumento para facilitar a lavagem de dinheiro obtido de forma ilícita por esses seus clientes.

No fundo, a matéria não tem qualquer pretensão se informar como é a vida de advogados criminalistas, até porque não fez qualquer incursão nesse terreno, mas única e exclusivamente, expor-lhes à escárnio público, inserindo-os no grupo de pessoas que também (sim, pois vários grupos já foram tarjados como “indesejados” pela revista) precisam ser rejeitados pela sociedade de bem (algo muito subjetivo, afinal, o que é ser “de bem”?).

Por que isso? Para diminuir cada vez mais as chances de pessoas processadas criminalmente terem seus direitos respeitados perante o Judiciário, Ministério Público e Polícia, pois ao constranger os advogados, como se fossem “sócios” dos clientes em seus crimes, tentam minimizar a força de suas afirmações, de suas teses, de suas argumentações, e por consequência, aumentar as chances de não obterem sucesso em seus pleitos, aumentando também as chances de seus clientes serem submetidos ao direito penal máximo.

Ou seja, miram nos advogados, mas intencionalmente acertam nos clientes. O risco, nesse caso, é de que ao aceitarmos essa prática, legitimarmos a crença de que advogados são desnecessários, todos poderão ser processados sem direito a uma defesa técnica. Sim, todos, inclusive você, caro leitor, seria — nessa hipótese — colocado diante de um juiz, promotor ou delegado, em causas administrativas, cíveis ou mesmo criminais, mas não poderia contar com um advogado. Seria somente você e os agentes do Estado. Acredita que teria chance de sucesso apenas expondo sua versão?

Nós, criminalistas por vocação, passamos dias de nossas vidas em presídios, ou em tribunais do júri, bem longe dos cenários de colarinho branco, defendendo pessoas de baixa renda de forma voluntária e bem longe de qualquer universo de luxo e de realeza. E por vezes, lecionando para alunos que intencionam seguir carreira no mundo do Direito, com a intenção de lhes facilitar a vida acadêmica e a que virá logo após a colação de grau.

Se os advogados são bem remunerados, ao atuarem em causas altamente complexas, difíceis, procurando contraditar a atuação altamente eficiente de grupos de trabalho com centenas de membros do Ministério Público e Polícias, isso não pode ser motivo de constrangimento nem crítica, mas longe disso, de reconhecimento de bom trabalho desenvolvido, certamente fruto de muito esforço, dedicação, estudo — elementos de sucesso profissional que procuro sempre mencionar aos meus alunos em sala de aula e aos colegas em início de carreira.

Não por acaso, na abertura na XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, nessa segunda-feira (27/11), o tema principal de todos os painéis foi a necessidade de respeito às prerrogativas dos advogados, não em benefício dos advogados, mas em favor dos cidadãos que se veem representados por eles.

Onde não há prerrogativa da advocacia respeitada, não há democracia.

Pedro Paulo Medeiros