Desde 1988, a Constituição Federal impõe, em seu artigo 227, ao Estado, à sociedade e a família o dever de assegurar, às crianças, com prioridade absoluta “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. No entanto, essa conquista da sociedade brasileira que deveria tratar as questões da infância e juventude como prioridade absoluta agoniza em grandes ausências que ferem não só a Legislação como o direito fundamental de crianças e adolescentes.

A falta de contratação de novos funcionários, não realização de concursos e a redução por aposentadorias de profissionais que compõem a equipe técnica do Setor de Cadastro de Adotantes e Adotandos do Fórum Clóvis Beviláqua, de Fortaleza, é mais retrato cruel de como a Infância e Juventude vem sendo tratados. Se com seis profissionais, já existia uma incapacidade de cumprimento dos prazos estabelecidos pela Lei para que processos como habilitação, vinculação e adoções acontecessem, agora, com metade de profissionais o cenário se agrava.

A redução da equipe não implica somente na deficiência dos processos de habilitação de pretendentes à adoção, o que já é uma negação do Estado às famílias. Essa equipe minguada cuida da adoção, vinculação, tutelas, guardas e processos que impactam diretamente no tempo de institucionalização de meninos e meninas que aguardam o tempo de serem filhos. O tempo máximo de 1 ano e meio de institucionalização de crianças e adolescentes não é respeitado assim. Com isso, o abrigamento prolongado é uma realidade que não só fere o que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente, como sufoca os sonhos e esperanças de pequenos cearenses ao direito de  viverem em família.

Por causa dessa redução da equipe, o curso de habilitação de pretendentes à adoção que aconteceria em agosto foi cancelado. O tempo de habilitação que deveria, por lei, durar seis meses, se alonga enquanto crianças e adolescentes poderiam estar encontrando suas famílias e seus lares. Os apadrinhamentos também ficam empacados, não há como fazer acompanhamentos das entregas legais e muito menos fazer com que prazos sejam cumpridos. Houve uma crescente de adoções nos últimos cinco anos e não houve, em contrapartida, um aumento no investimento nessa área.

O que se cobra com essa carta e com o Ato Pela Adoção, que acontece no dia 10 de agosto, às 11h30 em frente ao Fórum Clóvis Beviláqua, é que se garanta a prioridade absoluta para crianças e adolescentes. O que se exige é que a equipe  técnica interdisciplinar do Setor de Adoção exista em número e capacitação para que os processos aconteçam e que cada dia seja um dia a menos que meninos e meninas durmam sem serem filhos e filhas.

MirelLa Correia
Presidente da Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-CE

Michelle Pascoa 
Historiadora e Coordenadora do Coletivo de Pais Adotivos e Pretendentes à Adoção