“A cada cinco minutos, 6 mulheres são agredidas no Brasil. A violência é um reflexo de uma cultura e um comportamento que se tinha como normal, como padrão”, foi com esta afirmativa que a Presidente da Comissão da Mulher Advogada (CMA) da OAB-CE, Christiane Leitão, deu início à palestra proferida no dia 20 de novembro, na sede da seccional cearense, com o tema: “O Lugar da mulher na família – Aspectos históricos, sociológicos e jurídicos”.

Questões sobre empoderamento feminino, sororidade, lei do divórcio, machismo, patriarcado e a Lei Maria da Penha foram colocados em questão, com a finalidade de discutir e fomentar a discussão sobre o papel da mulher na contemporaneidade. A Presidente da CMA, Christiane Leitão, reiterou que, apesar dos direitos já conquistados, as mulheres precisam de mais articulação para que possam ser cada vez mais valorizadas e politizadas. “Esqueçamos dessas ideias retrógradas de que o movimento feminista é de mulheres mal-amadas, rebeldes ou problemáticas. Não, o que se quer é respeito, mais igualdade, o que se quer é direito”.

No evento, a Lei Júlia Matos foi destacada pela vice-presidente da OAB-CE, Vládia Feitosa. Sancionada em 2016, a lei estipula os direitos e as garantias para a advogada gestante, lactante, adotante ou que der à luz; bem como para o advogado que se tornar pai. Dentre os direitos, estão: entrada em tribunais sem ser submetida a detectores de metais e aparelhos de raios X, reserva de vaga em garagens dos fóruns dos tribunais, entre outros.

Poucos conhecem a história da lei, mas ela surgiu pelo fato de em 2013, a advogada Daniela Teixeira, grávida de 29 semanas, precisar proferir uma sustentação oral de uma causa, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e teve o seu pedido de preferência negado pelo presidente do CNJ, na época. Dessa forma, advogada esperou uma manhã e metade da tarde para ver seu processo ser apregoado. Ganhou a causa, mas saiu de lá com contrações, tendo como resultado o nascimento da filha prematuramente, com pouco mais de um quilo, ficando 61 dias na UTI. A advogada teve a iniciativa de debater a questão e, na época, na qualidade de diretora da OAB/DF, reuniu, em fins de 2015, mais de 400 advogadas para elaborarem o projeto de lei, que levaria o nome de sua filha, Júlia Matos.

“Devemos nos apropriar dessa lei e, inclusive, cobrar o seu cumprimento por parte de todos, pois ela versa sobre nossas prerrogativas. Nós, que somos destinatárias da lei, muitas vezes a desconhecemos, quem dirá juízes, magistrados e desembargadores”, declarou Vládia Feitosa.

A professora e mestre em direito constitucional, Emília Lopes, disse que “em 1891, após a proclamação da república, nós temos a nossa primeira constituição republicana, que em um dos seus artigos dizia que a mulher não era cidadã. No artigo, eram considerados cidadãos os homens e alguns outros sujeitos, mas a mulher não era citada. A mulher não era cidadã, a mulher não podia votar. Isso era um reflexo social refletindo no jurídico, ou melhor, na principal norma, lei do nosso país, que era a constituição. Temos um modelo patriarcal instalado na própria constituição. Quando eu digo que a mulher não é cidadã e que o homem é, isso é um reflexo dessa dominação do sexo masculino sobre o sexo feminino”, disse Emília Lopes, que também falou sobre questões que envolvem o feminismo, a lei do divórcio, bem como a conquista do direito ao voto das mulheres.

A delegada da polícia civil, Ana Cristina Lima, focou na Lei Maria da Penha, além de falar também sobre sororidade e empoderamento feminino. “Há cinco tipos de violência que consistem a Lei Maria da Penha, que são a violência física, patrimonial, sexual, psicológica e moral. Esses tipos independem da orientação sexual e, qualquer uma delas, pode gerar uma prisão em flagrante delito do agressor, que não será conduzido mais ao juizado especial, ele irá preso. E havendo os requisitos da prisão preventiva, não poderá pagar fiança”, afirmou a delegada.

A membro da CMA, Sarah Lima, disse que o debate é de suma importância, pois abre uma discussão abrangente sobre o tema. “Os operadores do direito precisam observar a importância de um debate como esse, além de entenderem que precisam compreender um pouco mais dessas questões históricas e sociológicas, para melhor operar o próprio direito. Isso favorece a interpretação e a aplicação das normas jurídicas”, enfatizou.

A mesa do evento foi composta pela Presidente da CMA e sua membro, Christiane Leitão e Sarah Lima, respectivamente; a vice-presidente da OAB-CE, Vládia Feitosa; a professora e mestre em direito constitucional, Emília Lopes e a delegada da polícia civil, Ana Cristina Lima.