A OAB-CE, através de sua Comissão de Saúde (CDS), realizou, na terça-feira (28), audiência pública virtual sobre o fechamento do serviço de pediatria do Hospital Geral de Fortaleza (HGF). O debate foi marcado por uma discussão técnica de alto nível em torno da inviabilidade de recebimento do serviço de pediatria do HGF pelo Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), nas circunstâncias atuais, por insuficiência de espaço físicotendo em vista o Hospital Albert Sabin já funcionar em situação de superlotação com deficiência de leitos de enfermaria, UTI, longas filas do serviço de cirurgia e consultas especializadas.

Recebendo o secretário da Saúde do Ceará, Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho (Dr.Cabeto), representantes das diversas especialidades médicas afins, representantes do Ministério Público e Defensoria Pública, o encontro ampliou o debate sobre a qualidade do atendimento e o bem-estar das famílias, para que não haja prejuízos na atenção à saúde das crianças.

O presidente da OAB-CE, Erinaldo Dantas, saudou todos os presentes durante a abertura da audiência, parabenizando a iniciativa da Comissão. “Esse diálogo é fundamental para a continuidade do atendimento, principalmente pelo caráter de extrema importância da Pediatria. O debate é rico e deve ser contemplado para que a sociedade em nenhum momento seja prejudicada”, destacou.

Ricardo Madeiro, presidente da Comissão de Saúde da OAB-CE, ressaltou a importância da audiência para o engrandecimento do debate em torno da mudança do atendimento. “A saída do serviço de Pediatria do Hospital Geral poderá afetar diversos segmentos, como as próprias crianças que já têm segmentos em diversas especialidades. Obviamente poderá ser afetada também a própria sociedade e o próprio Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública, porque certamente haverá um aumento da judicialização. O mais importante é que não haja prejuízos na atenção à saúde”, pontuou.

Durante fala, o secretário, Dr. Cabeto, defendeu que o objetivo da transferência é a valorização da Pediatria, onde é necessário ter um atendimento universal. “Temos o Albert Sabin como uma referência de alta complexidade para todo o Ceará. Resgatamos o plano diretor e estamos implantando algumas reformas estruturantes imediatas, que têm sido feitas com um planejamento adequado. Entendemos que não tendo a emergência Pediátrica e uma UTI Pediátrica no Hospital Geral, a complexidade dos doentes que podem ser internados reduz muito. Então, trazê-los para uma reunião conjunta onde a gente fortaleça o Albert Sabin, garantindo que não se reduza um leito sequer, que todos os serviços sejam transferidos da forma mais adequada e que os ambulatórios podem ser ajustados, uma vez havendo essa situação, haverá a transferência. Considero essa uma ótima oportunidade para esclarecer que é uma realidade não imposta e que será dialogada com base em parâmetros claros”, pontuou o titular da Sesa-CE.

A ouvidora-geral do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), Isabel Maria Salustiano Arruda Porto, salientou a importância de entender a situação como um todo, recomendando também a solicitação do retorno do quantitativo dos leitos. “É importante a gente saber quais tipos de serviços serão transferidos. O que nós queremos são esclarecimentos e a contextualização daquilo que vai ser transferido para o Hospital Albert Sabin, já que nós sabemos que ele não terá condições de receber alguns serviços”, apontou.

A diretora do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), Patrícia Jereissati, explicou que as mudanças na pediatria estão sendo avaliadas de forma conjunta para que a sociedade não seja prejudicada. “Nós formamos um grupo técnico para combinar tudo o que vai ser feito, envolvendo a transição do ambulatório, tudo de forma gradual. Vamos avaliar o que vai ser possível trazer para o Albert Sabin. Será tudo de forma pactuada e responsável. Em momento algum a população vai ficar desassistida”, explicou.

Durante o encontro, o diretor-geral do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), Daniel Holanda, expôs dados sobre o atendimento, falando também sobre os serviços que podem ser ampliados ou implementados na unidade. “Existe uma série de parâmetros que a gente tem que colocar em jogo. Todas as mudanças têm que ser pesadas. Nossa função como gestor do HGF é levantar os dados e ter essa visão estratégica enquanto unidade de saúde. A gente espera que o que for construído seja o melhor para o usuário, obedecendo as regras de segurança de trabalho e de segurança do paciente”, pontuou.

Já a chefe de Pediatria do HGF, Elizabeth Versa, evidenciou que a unidade tem serviços específicos na área, pontuando a dificuldade da transferência desse atendimento. “Quando a gente pensa na mudança, isso tem que ser colocado de uma maneira muito clara e transparente, para que a gente consiga o melhor. No primeiro momento, sabemos que alguns serviços não teriam espaço físico para ser executados, nem alguns processos conseguiriam ser desenvolvidos. A situação precisa ser analisada”, frisou.

O coordenador da Residência Médica do HGF, Jaime Benevides, analisou as consequências negativas da possível transferência, principalmente na formação dos profissionais que se encontram na unidade. “Além de toda a questão da residência médica e do internato, sem dúvidas nós poderemos ter uma grande perda na formação desses especialistas e na assistência às crianças e aos adolescentes da nossa cidade. Necessitamos discutir soluções para as demandas do próprio HGF”, defendeu.

O presidente da Associação Cearense de Cirurgia Pediátrica (CIPE-CE), Aldo Melo, enfatizou que a mudança pode prejudicar o atendimento pediátrico, propondo medidas para o desenvolvimento da área. “A Pediatria do HGF conseguiria ampliar ou, pelo menos, manter seu papel se transferida para o HIAS? De jeito nenhum. Nós não conseguimos nem dar conta do que nós temos. Por isso, várias interferências da sociedade civil ao longo dessa semana têm sido de dizer que a transferência é uma extinção. O que nós precisamos fazer hoje é implementar ações para a melhoria transitória, com a manutenção da Pediatria do HGF e planejamento e execução do novo HIAS”, afirmou.

Para o promotor de justiça do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), Eneas Romero, é primordial entender como o processo acontecerá para garantir a assistência de crianças e adolescentes. “O primeiro encaminhamento é que a Sesa apresente a proposta de redimensionamento e reordenação da rede infantil. Precisamos entender como vai se dar esse redimensionamento, para que se a transferência ocorrer, o Sabin, que já se encontra lotado e com a demanda acima da sua capacidade, possa absorver essa demanda e qual o planejamento para isso. O mínimo que pode ser exigido, nesse caso, é que o número de atendimentos seja igual e a qualidade seja mantida”, ressaltou.

Já a supervisora do Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa) da Defensoria Pública do Estado (DPCE), defensora Eunice Colares, evidenciou que essa mudança pode aumentar o número de demandas judiciais, reforçando a necessidade do debate. “Nós precisamos pensar juntos, a sociedade civil, os médicos, a gestão tem que ouvir a equipe médica, para que se chegue a uma solução que não traga prejuízos às pessoas que mais necessitam. Antes que comece essa transição, precisa ser feito um estudo realmente da demanda que é atendida no HIAS e no HGF, com levantamento de leitos, especialidades, como vai ser feita essa transição e se o HIAS consegue absorver a demanda”, pontuou.

Participaram ainda da audiência pública: a promotora de Justiça da 137ª Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde Pública, Ana Cláudia Albuquerque; a presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica (CIPE), Socorro Mendonça; o ouvidor do Conselho Regional de Medicina do Ceará (CREMEC), Ricardo Sidou; a coordenadora geral do Internato no HGF, Maria Nicó Alves; a médica intensivista do HGF, Melicia Aguiar; a médica residente da Pediatria do HGF, Andrinny Alves; o médico da Unidade de Reumatologia Pediátrica do HGF, Carlos Rabelo; e membros da Comissão de Saúde da OAB-CE.

Ao final da audiência pública, em consenso, os participantes definiram duas deliberações: solicitação à Sesa de uma proposta de redimensionamento da Rede Infantil do HGF e do Estado do Ceará, com seu devido cronograma; e recomendação para que a Sesa se abstenha de continuar com a redução dos leitos e volte ao status quo de 35 leitos no HGF, até a apresentação do projeto de transferência e sua possível viabilidade.