Na parábola bíblica, escrita por Mateus, inimigos dos servos de Cristo sorrateiramente arremessaram joio no meio do trigo no que estes indagaram ao Messias: “Queres, então, que o arranquemos? Não, respondeu Ele, para que não suceda que, tirando o joio, arranqueis com ele também o trigo. Deixai crescer ambos juntos; e no tempo da ceifa direi aos ceifeiros: – Ajuntai o joio e queimem-no; mas o trigo recolham no meu celeiro".

 

A nitidez meridiana desta parábola serve de inspiração aos homens de bem, que sabem, não devem, travestindo-se de vestais, antecederem-se ao julgamento e “lavrar sentença” de um fato que ainda permanece sob detida investigação. Este é o princípio do bom Direito, aquele que os operadores sensatos professam e utilizam.

 

É mais que oportuno que reflitamos sobre esta máxima cristã, neste momento em que tantos gestores públicos estão sendo investigados pelo Ministério Público (MP) e debaixo de seríssimas acusações. No Ceará, o MP tem buscado encontrar, entre os alcaides de cada município, aqueles que infringiram a lei, que se utilizaram do cargo para enriquecimento ilícito. Louvável atitude. Os cearenses agradecem.

 

Todavia, ao procurar culpados, é imperioso que se aja com sobra de zelo e prudência para não juntar numa mesma saca, o joio e o trigo, devastando famílias e a biografia de muitos homens sérios, empenhados em gerenciar seus municípios com ética. Tem se tornado rotina a divulgação precipitada de nomes de investigados (em procedimentos que fluem em segredo de Justiça) à imprensa que, após a explosão de manchetes, não é raro presenciarmos a própria mídia precisar retificar informes e corrigir excessos. Tarde demais. Já foram instalados o pânico, o prejulgamento, e a honra de determinadas pessoas foi espancada impiedosamente.

 

Nesta nébula fumarenta da pirotecnia, autoridades que “alimentam” o apetite da imprensa agem de forma, no mínimo, irresponsável. Às portas de uma sucessão municipal, muitos empresários, profissionais liberais, políticos, que desejavam servir à sua gente, estão sob o fogo inibidor do denuncismo e já refugam a possibilidade de candidaturas, que antes eram tidas por suas comunidades como certas para cada lugar.

 

Assim, o que seria um serviço prestado ao bem comum, distinguindo cidadãos de moral ilibada daqueles daninhos, passou a ser uma caça às bruxas, genérica e de resultados ainda desconhecidos. O preocupante é assistir a um esvaziamento de pretensões políticas, criando um danoso vácuo numa democracia ainda frágil como a brasileira.

 

 

Leandro Duarte Vasques, [email protected]

Advogado, professor da Universidade de Fortaleza e presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Ceará