A população cearense que procura assistência jurídica na Defensoria Pública do Estado do Ceará, em Fortaleza, está sendo alvo de aliciadores contratados por advogados ou falsos advogados, com o intuito de convencer quem procura ajuda a gastar o pouco que tem. A denúncia em questão parte do próprio órgão, que se vê cansado de tentar acabar com a prática dos chamados “laçadores” ou “catadores”, que diariamente atuam no entorno da instituição, prometendo solução rápida e imediata aos mais carentes.

O certo é que não existe uma ação efetiva coibindo a prática de aliciamento. Os esclarecimentos à população dando conta de que os serviços da Defensoria Pública são gratuitos, muito embora demandem tempo para suas resoluções, afastam os cidadãos mais apressados, ávidos por soluções imediatas.

E é aí que entram em cena os “laçadores” com suas promessas de resultados. A equipe de reportagem viveu a situação cotidiana da população que se apressa em resolver seus problemas. Em visita, ontem, à Defensoria Pública, foi simulada uma situação de desespero. O “laçador” veio logo ao socorro, garantindo a imediata solução. “Aí na Defensoria, você não vai arranjar nada”, disse. E quis saber qual o problema. O repórter contou que um primo, acusado de latrocínio, estava preso há duas semanas.

Para resolver o problema, o aliciador antecipou-se com a solução. Só que não sairia de graça. “A família está disposta a ajudar ou é só você? Se ela for ajudar, vai ter que ter dinheiro. É preciso pagar as custas do processo para ele sair logo da cadeia. Se for um advogado particular, não sai por menos de R$ 5 mil. Mas comigo, com meu amigo que é advogado, a gente faz por R$ 2 mil. Tá bom pra você?”, indagou o “laçador”. “É tudo advogado da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)”, garantia.

Depois de achar que seria mais um caso para o escritório do “patrão”, ele ligou de seu celular para o “doutor”. Em menos de cinco minutos, um homem jovem, alto, com argumentos jurídicos na ponta da língua, veio ao nosso encontro. Queria detalhes do suposto preso, mas foi logo garantindo a soltura do indivíduo e a “senha certa” no Fórum Clóvis Beviláqua.

Na companhia do repórter, mais duas senhoras de meia idade também acreditaram na promessa de solução fácil.

Para o coordenador da Defensoria Pública/Capital, Carlos Levi Costa Pessoa, o que está acontecendo não chega a ser crime. “Eles se utilizam da fragilidade da população, dando garantias de resultado. Nós só podemos dar a garantia de que o processo será devidamente acompanhado. Ninguém pode garantir resultado”, atesta

A Defensoria Pública está trabalhando em conjunto com a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Ceará, através de seu Departamento de Inteligência, em diligências, no intuito de coibir e identificar os “laçadores” e os advogados.

Carlos Levi revela que muitas pessoas já voltaram à Defensoria revelando seu desapontamento por ter acreditado no resultado fácil. As principais vítimas dos aliciadores são pessoas idosas, cidadãos com problemas com a Justiça – como pagamento de pensão alimentícia e guarda de menores – e presos do sistema penitenciário. “Muitos voltam revoltados quando descobrem que nenhuma ação foi feita efetivamente”, comenta Levi.

Segundo o coordenador, o assunto foi tratado, ontem, em reunião com a Polícia Militar. Ele informou que suspeitos já estão sendo investigados.

Punição

De acordo com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Secção Ceará (OAB/CE), Valdetário Monteiro, o órgão já puniu devidamente cerca de 100 advogados pela utilização de “laçadores”. Estas sanções vão desde advertência, passando por suspensão, até o cancelamento da inscrição junto à OAB.

Monteiro revela que a OAB/CE está trabalhando para agilizar os serviços prestados à população. Para ele, a situação “é algo complicado de se resolver em definitivo” e que inúmeras campanhas nas redes sociais atentam para a questão.

O presidente acrescenta que qualquer consulta a advogados pode ser checada. “No nosso site, todos os advogados têm seu número de inscrição. Se aparecer algum advogado com número de inscrição acima começando por 29 ou 30 mil, é preciso denunciar. Nossas inscrições ainda estão no número 28 mil”, alerta Monteiro.

SAIBA MAIS

Defensoria Pública

Núcleos
Família, Cível, Fazenda Pública, Tutela Coletiva e Criminal
Defensores Públicos
São 293, sendo 197 na Capital e 96 no Interior

Comarcas
São 138. Destas, 89 contam com defensor, enquanto 49 estão sem defensores

Vagas
122 cargos de defensor público estão abertos no Ceará, à espera de preenchimento de vagas. Quixeramobim, Crateús e Tauá são exemplos de comarcas que perderam seus defensores em 2012

Mais informações
Para denunciar:
Centro de Apoio e Defesa do Advogado – 0800.0850800
OAB-CE – http://oabce.org.br/

 

Fonte: Diário do Nordeste