“Mulata tipo exportação”, “da cor do pecado” e “não sou tuas nega” são algumas das expressões racistas mais comuns que expõem os estereótipos hiperssexualizados das mulheres negras. O processo de colonização e o sistema escravocrata deixaram profundas marcas em nossa historia, que comprovam o fato inegável de que os corpos femininos negros e indígenas foram colonizados junto com a terra. Em 2019, 56,2% da população brasileira se declarou preta ou parda segundo dados do IBGE. No entanto, praticamente todas as referencias imagéticas do bem ou do belo resultam de um processo constante de embranquecimento eurocêntrico.

A objetificação da mulher negra, que se manifesta em algumas das expressões mencionadas, integra um processo constante de violência gênero-racial que aprisiona o corpo feminino preto no lugar da servidão sexual sedimentada pelo racismo e patriarcado. As repercussões desse fenômeno são devastadoras. Em pesquisa realizada pela Universidade Federal da Bahia, no ano de 2017 as mulheres negras sofreram 73% dos casos de violência sexual registrados no Brasil, enquanto as mulheres brancas foram vitimadas em 12,8% das ocorrências. Não há como dissociar a hiperssexualização e outras questões raciais como integrantes do conjunto de múltiplas condições de vulnerabilidade das mulheres negras.

Numa discussão não embranquecida acerca da objetificação de mulheres negras, sobretudo periféricas, há que se pontuar uma necessária distinção entre hiperssexualização e a expressão da nossa sexualidade. Não cabe, numa reflexão aprofundada sobre o tema, uma visão elitista e academicista sem uma aproximação honesta. Pelo contrário, a escuta e a liberdade devem ser os pressupostos de qualquer discussão justa, cujo protagonismo pertence à diversidade de mulheres negras que também são periféricas, idosas, gordas, LGBTQI+ ou possuem deficiência.

Ressignificar as narrativas do cotidiano, respeitar e apreender as trajetórias de (re)existências individuais e coletivas do Eros Negro feminino é caminho fundamental na jornada rumo à descolonização das expressões da sexualidade das mulheres negras.

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Raquel Andrade, presidente da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB Ceará