Depois de dois anos da sanção, a LGPD entrou em vigor em setembro de 2020. No entanto, os artigos da 13.709/18 sobre sanções administrativas para quem desrespeitar as regras de tratamento de dados pessoais ainda não estão valendo. Por força da lei 14.010/20, as sanções entram em vigor a partir de 1º de agosto de 2021. Enquanto isso, empresas e instituições vão se adequando à norma.

O CNJ publicou, neste mês, normativa definindo as medidas que os tribunais devem adotar para a adequação à LGPD. A resolução foi aprovada em 22 de dezembro do ano passado, durante a 323ª sessão ordinária.

Cada tribunal deverá criar um CGPD – Comitê Gestor de Proteção de Dados Pessoais, instância que será responsável pela implementação da lei. O compartilhamento de dados em contratos e convênios devem ser revisados para se adequarem à LGPD.

Além disso, os órgãos do Judiciário precisam criar um site com informações sobre a aplicação da lei, incluindo requisitos para o tratamento legítimo de dados, os deveres deles e os direitos dos titulares dos dados e as informações sobre o encarregado por esse tratamento em cada tribunal.

Os portais eletrônicos devem apresentar os avisos de cookies e a política de privacidade para navegação e ainda deve ser criada uma política geral de privacidade e proteção de dados pessoais a ser aplicada no âmbito de cada tribunal e supervisionada pelo CGPD.

Colaboração

A nova norma foi elaborada por um grupo de trabalho instituído em outubro, por meio da portaria 212/20, com representantes dos tribunais, advogados, pesquisadores e acadêmicos.

“Esta proposta é uma concretização de um trabalho que já vinha sendo desenhado, com a finalidade de permitir aos tribunais, preservada a sua autonomia, a implementação de ações imediatas à sua adequação à Lei Geral de Proteção de Dados”, explicou o ministro do STJ Ricardo Villas Bôas Cueva, que integrou o grupo.

O grupo foi coordenado pelo conselheiro do CNJ Henrique Ávila. Ele lembrou o desafio que a LGPD representa ao setor público.

“A norma visa proteger os dados pessoais tanto ligados à iniciativa privada quanto à iniciativa pública. No poder público, sabemos a dificuldade de implementação, sobretudo quando nos referimos ao Poder Judiciário. São 91 tribunais no Brasil e as dificuldades de concatenação de ideias e de concentração de esforço são latentes.”

Ávila destacou que a definição de um padrão, de critérios mínimos, é um dos papeis essenciais do CNJ.

“Não estaria sendo possível uma norma de implementação única da LGPD em todos os tribunais, se não houvesse o CNJ. Neste ano em que o CNJ completa 15 anos, este exemplo é paradigmático da importância do órgão.”

STJ

O STJ já adotou diversas iniciativas para garantir o pleno cumprimento das disposições da LGPD. Por meio da portaria STJ/DG 590/20, a Corte instituiu comissão com a finalidade de elaborar estudo e identificar as medidas necessárias à implementação.

Em setembro de 2020, o STJ e o Conselho da Justiça Federal promoveram um webinário para debater a aplicação da nova legislação no Judiciário. O evento contou com a participação de várias autoridades e especialistas no assunto, que discutiram os caminhos para a efetivação da LGPD nos tribunais.

A Corte dispõe de uma página especial para a LGPD, que contém os pontos mais importantes da nova lei, glossário, notícias e publicações.

TJ/SP

O TJ/SP é um dos casos de Tribunal que vem se preparando com antecedência e é considerado um dos pioneiros na aplicação da LGPD. Em entrevista ao Migalhas, o juiz assessor da Presidência do TJ/SP, Fernando Tasso, contou que o Tribunal, antes mesmo da entrada em vigor da lei, em 2018, buscou encontros com especialistas para conversar sobre o tema.

O Tribunal adotou uma série de seminários e debates. Já em agosto de 2018, o TJ/SP realizava, pela Escola Paulista de Magistratura, o ciclo de palestras “O impacto da Lei Geral de Proteção de Dados nas lides forenses – dilemas práticos – uma abordagem comparativa à GDPR europeia”, considerado o marco zero do processo de conformidade na esfera do Judiciário paulista.

Tasso conta que em abril de 2019 o Tribunal contava com um grupo de estudo na CGJ e passaram a convidar doutrinadores para levar a visão de como implementar a LGPD no âmbito do Tribunal e, desde então, diversas iniciativas foram dando forma à concretização do plano de implementação.

O TJ/SP também foi um dos primeiros a lançar uma página na internet para dar visibilidade e transparência à implantação do modelo de governança organizacional para adequação do tribunal à LGPD.

A proposta concreta de implementação aconteceu no final de 2019. Em 2020, quando o então corregedor, Geraldo Francisco Pinheiro Franco, foi para a presidência, determinou a LGPD como prioridade e fixou o prazo para 16 de agosto, prazo original para vigência da lei.

“Em agosto de 2019 já tínhamos as principais adequações”, lembra Tasso, que acredita que o maior acerto para implementação da lei foi começar pelo meio acadêmico, debatendo e escutando especialistas no tema.

Para Tasso, no entanto, não houve oportunidade para erros, e essa pode ter sido a maior dificuldade. “Era tudo novo para todo mundo, não houve uma metodologia, não tinha receita de bolo”, contou.

Por ser o maior tribunal do país, Tasso acredita que há uma dificuldade no gerenciamento de comunicação e alinhamento entre todos os servidores. Eventos e workshops auxiliaram na gestão da nova rotina de trabalho e na própria cultura da Justiça paulista. “Buscamos capacitar pessoas que colocariam a mão na massa. À medida que você capacita, consegue uma jurisdição sem prejuízos aos dados”, salientou.

Para Tasso, ao final, o TJ/SP ganhou auto conhecimento das rotinas e dados, sem prejuízo à transparência. “A Justiça busca eficiência”, finalizou.

Fonte: Migalhas