O último dia 03 de Julho comemorou-se o dia de combate à discriminação racial no Brasil, e dentre as reflexões que faço, observando as fendas que as diversas realidades abrem dentro do nosso cotidiano, consigo enxergar um núcleo comum de quem é alvo da discriminação racial no Brasil: a dor.

Apesar do esforço de uma parcela convenientemente cega de nossa sociedade, não há como negar a marginalização do corpo negro nos mais variados setores da esfera social. A população negra é a que mais morre, que mais adoece, que percebe os piores salários e que menos tem acesso às políticas públicas. Veja, na corrida da vida, a pior colocação já tem um candidato definido, e esse massacre cotidiano é um termômetro social que enegrece o estágio civilizatório em que nos encontramos, revelando o cimento que deu base a esse país e que o estrutura até os dias de hoje: o racismo.

Por trás de todas as estatísticas desfavoráveis a população negra, existe necessariamente uma atuação direta para que o resultado seja sempre o mesmo. A sorte é que, para todo fluxo, existe a insurgência. E de maneira peculiar, a nossa resistência se impulsiona também com a dor. Longe de romantizar o sofrimento, mas a dor de quem já vivenciou a discriminação constrói um start comum, que só pode ser reconhecido por quem já viveu e/ou vive o racismo. Todos nós, pretos e pretas sabemos consciente ou inconscientemente, do sacrifício diário de se manter e permanecer física e mentalmente vivo numa estrutura que escancaradamente quer o nosso extermínio.

A dor de quem caminha contra fluxo e sobrevive como rebeldia pura ao sistema se transforma em um pacto silencioso que nos integra a grande rede invisível de resistência. Reconhecemo-nos através da dor.

A partir daí as estratégias de sobrevivência se aperfeiçoam e dão lugar a outro caminho possível: a luta. Para todos os cenários de violência que a discriminação racial proporciona, temos como contraponto a resistência, primogênita da dor, e seguimos traçando estratégias possíveis de vivência e sobrevivência para que um dia, essa liga que nos une seja substituída pela esperança de dias melhores.

Clique aqui e confira o artigo publicado pelo jornal Diário do Nordeste.

Tharrara Rodrigues, vice-presidente da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB-CE.