Uma das faces mais cruéis do capacitismo é o ato estrutural de invisibilizar as pessoas com deficiência nas atividades que exercem. Após mais de uma década como pessoa com deficiência física e tendo o diagnóstico recente de autismo, consigo hoje perceber como se opera o capacitismo institucional que invisibiliza e reduz pessoas com deficiência às suas deficiências, apenas.

Cansa estar em eventos, audiências, reuniões nas quais somos solenemente esquecidos ou a nossa presença e atuação é ignorada, como se advogados, jornalistas, médicos etc., profissionais enfim, com deficiência, fossem uma categoria profissional inferior.

Além disso, há o costume de se discutir a nossa pauta, por iniciativa e participação majoritária de pessoas sem deficiência, sem o nosso protagonismo. Mesmo existindo e ocupando cargos nessas estruturas, a regra ainda é a invisibilidade. Nos convidam para lotar os espaços apenas nas agendas que nos dizem respeito ou para bater palmas, mas dificilmente ocupamos as mesas desses espaços ou participamos da decisão. Quando alcançamos cargos de direção ou chefia, geralmente as gestões —lato sensu— nos enxergam apenas nas pastas ligadas à nossa luta: coordenadorias, secretarias, comissões ligadas às pessoas com deficiência. O resto não nos cabe.

Isso se dá em função da cruel omissão em relação ao mandamento constitucional que nos outorga a imprescindível participação, ativa e efetiva, nas decisões, debate e implementação de políticas e programas que nos afetem. Está na Convenção Internacional da ONU (decreto 6.949/2009) ao nível de emenda constitucional, solenemente esquecida.

Este texto não busca pregar para convertidos, mas sim falar às pessoas sem deficiência que acreditam ser constitucional decidir sobre as nossas vidas, sem a nossa presença, sem convidar e sem ouvir, gestores e gestoras, trabalhadores e trabalhadoras com deficiência (sim, estamos em todos os espaços, dos Ministérios Públicos às Defensorias, nas administrações públicas diretas e indiretas às gestões privadas).

Não é.

Emerson Damasceno, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB Ceará

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